quinta-feira, dezembro 24, 2009

Um Bom Natal para todos e obrigado pela ternura:).

Calcorreou centros comerciais, alfarrabistas, mercados, galerias de arte, discotecas e até o sótão lá de casa, que o pó guarda tesouros merecedores de laçarote feito e olhado com sorriso. Nada. Verdade que a ambição era de monta - presente que fosse arauto e espelho de sentimento profundo e cálido. O ridículo de voltar a casa de mãos vazias, quando as dos outros não chegavam para tanto embrulho:(. Ridículo... Pessoa... "Aquelas" cartas... A hesitação perante os riscos de um strip-tease verdadeiro e não disfarçado pela nudez. A secretária, o caderno de argolas promovido a papel de carta. As palavras. Primeiro tímidas e enferrujadas, depois em galope de rio tão ávido que desagua na outra margem do oceano. A mão cansada antes delas. A cabeça exigindo balanço, eventual correcção ou voo para o lixo, enfim!, pretextos para meter (alguma) ordem no coração. A difícil leitura de uma escrita vulcânica, sinuosa, aqui e ali hieroglífica, tal a pressa de chegar à palavra certa; definitiva. O desconsolo. E no entanto...
Um P.S. lento e diligente, herdeiro dos cadernos da escola primária, só faltava a língua espreitando à janela dos lábios - "Procurei que estas linhas desenhassem o que tento e não consigo dizer. Nem de um esboço chegaram perto:(. Mas repara bem - algures no seu entrançado caótico, elas abrigam o que te cose a mim. Feliz Natal."

Os versos finais da canção do Chico esgueirando-se, invisíveis, envelope dentro:
"O que será, que será?
Que todos os avisos não vão evitar
Por que todos os risos vão desafiar
Por que todos os sinos irão repicar
Por que todos os hinos irão consagrar
E todos os meninos vão desembestar
E todos os destinos irão se encontrar
E mesmo o Padre Eterno que nunca foi lá
Olhando aquele inferno vai abençoar
O que não tem governo nem nunca terá
O que não tem vergonha nem nunca terá
O que não tem juízo..."

Suspirou. Porque não se vende talento, nem sequer nas floristas? Porque não é passageiro obrigatório do Amor? Talvez para O tornar mais humano e democrático. O pensamento era reconfortante...
... Mas o tempo, esse, não era de torpor contemplativo, levantou-se de um pulo - a que horas fechariam os Correios?

domingo, dezembro 20, 2009

Boa noite.

Assim como, embora de forma irónica, zurzi forte e feio o Benfica de Olhão, hoje digo que os rapazes me deixariam orgulhoso, mesmo se um qualquer ressalto originasse o empate. Pelo que jogaram e pela forma como se bateram. Não exijo mais.

Boa noite.

Cantelães. O frio é severo, e no entanto acolhedor. Nem minha Mãe, agora anfitriã, permitiria que fosse de outro modo...

quarta-feira, dezembro 16, 2009

Boa noite.

Escrever-te sem te escrever, eis o segredo! Porque a simples fantasia da entrega do correio me inibe o pensamento, as palavras, os sinais de fumo, os innuendos. Aproveitar o facto de sempre me habitares coração terno e entranhas exasperadas e falar "para dentro", sem barreiras, como o amor no filme com música do Bernstein, "Maria, I just met a girl...". E alucinar, querida. A tua severa doçura refugiada num sorriso maroto e à boleia atrevendo-se a responder às pequenas loucuras que segredo aterrorizado, "e se lhe magoo a timidez?". O murmúrio tão desejado que dele duvido, "eu também". A custo meu, uns centímetros em brasa entre nós. Esses olhos nublados pelo desejo, todas as outras razões são possíveis, todas me empurram para longe. O meu silêncio indeciso, as tuas mãos, escandalizadas e risonhas, sorvendo-me para o teu colo, "eu também, ou duvidas?". É óbvio que duvido, mas tenho a certeza que não o direi. Se aqueles pouco centímetros me doeram, como arriscaria a demora de um ralhete? Mergulho em ti, ainda e sempre na esperança de ir tão fundo que seja impossível regressar à tona e com a verdade te engano - "claro que não".
E rezo para que tão descarada mentira prove, sem margem para dúvidas, quão genuíno é o apelo para que não afrouxes o teu abraço.

terça-feira, dezembro 15, 2009

Referenciado na sequência de inúmeras...

Uma mulher de 42 anos foi ontem baleada pelo ex-marido, em Leça da Palmeira, Matosinhos, na sequência de uma violenta discussão. O ataque aconteceu de madrugada e o agressor, de 47 anos, suicidou-se momentos depois nas traseiras da Exponor. Até à hora de fecho desta edição, a mulher continuava internada no Hospital de São João, no Porto, em morte cerebral.O casal vivia um complicado processo de divórcio litigioso. Ontem o homem resolveu terminar pelas próprias mãos o caso que se arrastava em tribunal. Ao final do dia, esperou que a mulher saísse do trabalho, em Leça da Palmeira. Pelas 23h45, o filho mais novo ligou à mãe: parecia assustada e confirmou estar com o ex-marido, o que levou o jovem de 15 anos a pedir a ajuda da PSP, confirmou ao i fonte policial. O homem estava já referenciado na sequência de inúmeras ameaças e actos de violência doméstica.A PSP enviou carros-patrulha a pontos-chave da cidade, mas não conseguiu detectar o automóvel do agressor, que entretanto já se deslocava para Aveleda, Vila do Conde. Antes, ligou a um irmão contando que ia matar a mulher e suicidar-se. A família contactou as autoridades, mas já era tarde. A mulher terá levado um tiro na cabeça na sequência de uma violenta discussão, contou ao i fonte policial. O seu corpo foi depois transportado, na Renault Express, até à Rua da Agra Nova, em Aveleda, onde foi abandonado. O marido voltou então a Matosinhos, estacionando no parque da Exponor. Após a meia-noite, a PSP foi chamada ao local, onde encontrou o homem morto a tiro na carrinha, com a pistola ao lado. Ao mesmo tempo, GNR e Cruz Vermelha de Vila do Conde eram avisados por condutores da presença de alguém ferido na via pública, em Aveleda. A mulher - que tem outro filho, de 20 anos - entrou no hospital de São João às 3h00, já em morte cerebral.

Quando os números são de carne e osso:(.

A minha ex-empregada foi morta pelo ex-marido, que se suicidou a seguir. Antes disso fora agredida em privado e em público várias vezes. Pediu ajuda e ela não veio. Amanhã ou no fim do mês será um número nas estatísticas. Cá em casa era uma mulher pálida, triste, às vezes queixosa, nunca esperançada. Quando eu entrava a horas inesperadas, tinha de me anunciar em voz alta para que não entrasse em pânico. Deixou de vir porque morava longe. Morreu porque uma sociedade inteira vivia longe dela:(.

domingo, dezembro 13, 2009

A deformação profissional:).

Hoje convidei o psi para assistir ao jogo do Benfica lado a lado com o maluquinho da bola. Disse-lhe que certo jogo com o Trofense ainda me assombrava as noites e talvez precisasse de uma opinião dele. Quando o paupérrimo e trauliteiro espectáculo de Olhão terminou, perguntei - "E que me diz?". O tipo olhou-me de revés, sorveu mais um golo... - ui, que acto falhado, diria ele:) - de chá de tília e diagnosticou: imaturidade emocional colectiva, baixíssima tolerância à frustração com explosões de agressividade, prováveis tendências suicidárias, é de recear descompensação grave na quadra natalícia.
"Jesus", gemi eu. Já a caminho da porta, ainda murmurou - "esse também me pareceu desorientado e com alucinações ao descrever o jogo... Quer que volte no Domingo?". Agradeci o gentil oferecimento, mas recusei, o sofá tem dois lugares e acho mais seguro ter comigo um cardiologista!

quinta-feira, dezembro 10, 2009

Boa noite.

Reviver o passado em Brideshead. A série televisiva fascinou-me tanto que não consigo apreciar o filme com isenção, mesmo com a extraordinária - e não surpreendente... - representação de Emma Thompson. Irónicos, versos dos Floyd dentro de mim:

"Hanging on in quiet desperation is the English way
The time is gone, the song is over,
Thought I'd something more to say."

The English way????? Mas quem lhes concedeu tal monopólio?:).

terça-feira, dezembro 08, 2009

Boa continuação:).

Zapping pós-prandial. Sonolento, por pós-bacalhau e tintol alentejano. (Como sou homem não notei o efeito afrodisíaco que recente artigo anuncia para as mulheres:(. E de todas a regiões vinícolas!). Cinema Paraíso... Há muitos anos escrevi um texto sobre o filme que releio hoje com alguma nostalgia - o meu encantamento era então mais arrebatado e a culpa não pertence ao filme, perdi fogo interior. O sono levantou voo, o riso e a lamechice apresentaram-se ao serviço, como em todas as n vezes em que vi a fita. Que já utilizei para falar de amor adolescente, fugas ao passado, dores de crescimento, lutos por gente viva, idealizações perigosas, paixão pela paixão do outro, etc... Mas hoje limitei-me a ir indo, vendo, aprendendo. E invejando aquele extraordinário Noiret!, um homem que faz o Cinema Paraíso e O Carteiro de Pablo Neruda pode roubar-lhe a frase e gritar do Céu dos artistas - confesso que vivi:).

terça-feira, dezembro 01, 2009

Boa noite.

Uma equipa apresenta-me uma proposta terapêutica consensual. A argumentação é sólida, concordo com ela. Tenho a certeza que a decisão será a melhor no que ao futuro diz respeito. E no entanto, o meu "faça-se" empurrou uma criança para longe de quem amava e o amava a ele, receio que esta tenha sido uma noite de lágrimas para o petiz. Que não compreende sequer o significado das palavras "argumentação" e "futuro" e se pergunta o que fez de mal para perder afagos e cuidados maternais, oficialmente baptizados de apoio técnico.
Fiz o que devia.
Tenho a consciência tranquila.
Sei que angústias longínquas o desgosto do miúdo espicaçou dentro de mim.
Mas nada suaviza a tristeza culpada com que o recordo.