Maria,
A estrada. O nervoso miudinho, há trinta e sete anos que entra nos anfiteatros empoleirado no meu ombro. E contudo... Antigamente deixava-os a tricotar dúvidas monótonas: gostaram?; aprenderam alguma coisa?; fui simples e não simplista? Hoje, o público mais severo acoita-se dentro de mim. Acontece terminar uma conferência e ouvir, espantado, elogios. Pois não perceberam - como eu! - que discurso e pensamento avançavam (?) aos solavancos?
Quando estavas e ficavas... Eu dizia não me apetecer partir e buscava esse colo, ao mesmo tempo maternal e excitante. O sorriso; a mão à solta pelos meus cabelos; o beijo na testa, que fugi aos meus lábios, ansiosos por atraso, desculpa de última hora, recuo, desfazer do saco que tu supervisionavas para eu não me passear disfarçado de mendigo.
"Quando voltares, para mim e para o Porto...", dizias. E eu apontava à estrada, calando o ciúme pelo arquitecto que te arrastava a asa quando me sabia ausente e não só, eu forçado a admitir que fosses tu minha filha e to aconselharia em vez de mim, péssimo partido e duvidoso amante; impróprio para consumo, até em sociedade que nele se lança de olhos fechados e carteiras escancaradas.
Espero que a A1 me devolva ao Porto. Mas sei que me receberá de braços abertos e sobrolho franzido, "e ela?". Porque sempre me vê partir com a firme convicção de que a única boa razão para o deixar és tu - disposta, por fim, a regressar. E como não duvida do teu amor, volta ao granítico cinzento com a certeza de quem é o culpado do vosso divórcio. É verdade, conheço-te. Saia eu da cidade - ou em definitivo da tua cabeça... - e voltarás.
Quase me apetece buscar refúgio em Gaia, diluir-me na paisagem, sacar dos binóculos e esperar. Pois não fazem assim os amantes das aves?
29 comentários:
...Pois não fazem assim os amantes das aves?...
...
...mais uma bela ruminação
...abraço
"Pediste-me que não te deixe, que entrei na tua vida como um vulcão,que és infeliz, que estás triste...
Compreendo-te bem, já passei por tudo isso, fases em que a vida já não faz sentido, em que estamos a mais e sós, em que pensamos em desaparecer de mansinho..."(continua)
Perante a dor e sofrimento e no limite da crise, pensemos que é apenas uma fase.
Desconfio que Gaia não apetece mesmo nada...
Valerá a pena vê-la lá nos céus,irreconhecível porque vazia DELE?
E a cara de espanto dum Porto cúmplice, ao sentir a sua chegada sem sabor a regresso a casa?
Mil vezes ficar, continuando ainda que na lonjura a povoá -la a ELA!
Quando rumina assim, eu calo-me:)
"..eu forçado a admitir que fosses tu minha filha e to aconselharia em vez de mim, péssimo partido e duvidoso amante;"
:))) Loooooooooooooooooool
Não leve a mal mas o riso explodiu sem eu o poder conter:)
Os arquitectos têm quase sempre a vida e a carteira organizada; materializam o imaginário no construído. Os melhores perspectivam no que inventam uma época. São fazedores de casas, que habitá-las é pura humanidade.
Depois, salvo talvez essa perspectiva paterna, não há amantes duvidosos: se amante é aquele que ama, dado que ama, não é duvidoso. E péssimos partidos são ladróes(sobretudo os de colarinho engomado, quem não trabalha (mesmo que pareça que sim), quem não tem princípios.
Mas a beleza da imagem de quem espera pela ave...fez-me lembrar o Eugénio "Boa noite. Eu vou com as aves".
O que mais gosto de Gaia é o Porto que se vê; magia real em que se pode entrar atravessando a ponte e sempre me lembra o tempo das histórias contadas em que apetecia atravessar a página e ficar lá dentro. Talvez seja da luz, do espessamento na cor, o certo é que as pontes de Lisboa me dão outra alma.
E bom dia
:-)
Correndo o risco de quebrar o dramatismo do momento, aqui vai um excerto de uma canção em que me revejo. Porque, será uma fase?, eu sou daquelas que não gosta de ficar. Por causa das amarras. Só por isso.
"(...)
Volaste alrededor de la luna con ella,
Le pediste que nunca se fuera,
Y ella respondió:
Mi amor siempre estará cuidándote.
Y la dejaste volar,
Y tus ojos lloraron hasta doler,
Pero solo tu sabia que así tenía que ser, Que así tenia que ser."
Cuidandote, Bebe
http://www.youtube.com/watch?v=S9QEo6AVO3A
Tangerina de Marrocos
Tangerina
Fase de "mal de amor" para o que fica, pois tudo passa, um dia. Aquele que partiu, sabe que assim teria que ser, que não poderia mais tempo ficar amarrado, que teria que voar para outros céus, que ainda tinha sonhos para cumprir..., mas por vezes até isso é uma doce ilusão.
Littlehead,
"O que mais gosto de Gaia é o Porto que se vê"
Uiii..abusaste agora! Olha que há por aqui uma trupe Gaiense que lida com este tipo de comentários com faca e alguidar!!! ;))))
Prof,
duvidoso amante??? oh oh...essas coisas só se confessam na presença da ceifeira! :)
Littlehead,
"O que mais gosto de Gaia é o Porto que se vê"
Uiii..abusaste agora! Olha que há por aqui uma trupe Gaiense que lida com este tipo de comentários com faca e alguidar!!! ;))))
Prof,
duvidoso amante??? oh oh...essas coisas só se confessam na presença da ceifeira! :)
ALGUEM CONSEGUE DAR-ME O CONTACTO DO DR JULIO MACHADO VAZ PARA TENTAR UMA CONSULTA ?....
Aqui está: drjmv@netcabo.pt .
(Espero que a Dra. Mónica me perdoe pela usurpação de funções!! :))
É assim que fazem os amantes das aves, sim. Quanto ao resto,... não sei/sabemos ;P
Professor
Este seu post e tantos outros quão ilucidativos são ..
Tantas vozes, tanto ..tanto ...tudo ...todos falam e ninguem tem razão !!!
Há de facto Marias que felizmente gostam principalmente DELAS, ...acima de tudo!
obrigado
thorazine
obrigado pelo diminutivo inglês, dá-me um certo tom; ó pra mim, pareço outra coisa :)
Conheço mal Gaia, mas a vista que se tem do Porto é tão quase comovente que sempre volto. Gosto do afável das pessoas. No Porto ou em Gaia.
Quanto à faca e alguidar...digo como o Camilo "Maria, não me mates que sou tua mãe."
Um abraço ao "Porto Sentido" de todos nós.
6ºC,
Doce ilusão a da liberdade? A da pretensa falta de amarras? Doce, sim... pela inverdade que encerra.
Doce ilusão, também, a daqueles e daquelas que pensam que as gaiolas são feitas para os pássaros. As gaiolas são, apenas e só, as suas próprias prisões.
Bendito o que utiliza os binóculos. Ciente da sua prisão, concede aos pássaros a doce ilusão da liberdade.
Beijos e abraços.
Tangerina de Marrocos
Anedota do tempo do antigo estado:
Sr. Presidente, qual a sua opinião acerca de Almada Negreiros?
Após breves segundos, Tomaz responde quase indiferente: Almada 1, Negreiros 0.
De Almada Negreiros, "A Flor":
Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção , outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!
Moral da estória: A flor desenha-se diferente no íntimo de cada um de nós, mais bela, mais frágil, mais graciosa, mais perfumada... ou então... ando ha um bom tempo con vontade de adquirir um par de binóculos...
;))
Olá, não conhecia o seu blog!!
Gostei!!
Deixo a sugestão do meu:
http://abrirasportasaosucesso.blogspot.com/
Um beijinho
Sorrio... ;))))
"Quase me apetece buscar refúgio em Gaia, diluir-me na paisagem..."
Faz bem... os quilómetros de praia até o tornarão invisível por entre os pássaros que povoam o areal.
E sempre pode passear discretamente pelos passadiços…;)))
Um excelente 2009
Oh Professor então desce até cá a Lisboa e não dizia nada!:)
Na minha antiga escola, Faculdade de Letras de Lisboa, o Centro de História da Universidade de Lisboa organiza o I Curso Livre de Sexualidade e História em que o Professor abriu as festividades com a sua alocução subordinada ao tema: "Roma e a sua moral da violação".
Com temas muito interessantes, deixo aqui o programa para quem quiser espreitar ou melhor, frequentar:
7Jan: Roma e a sua moral da violação
Júlio Machado Vaz
14 Jan: Na Pré-História do sexo: entre a natureza e a cultura
João Pedro Ribeiro e Mariana Diniz
21 Jan: Assim na terra como no céu: a sexualidade no Antigo Egipto
Luís Manuel de Araújo
28 Jan: A sexualidade no Oriente pré-clássico e bíblico
José Augusto Ramos e Francisco Caramelo
4 Fev: Eurídice é morta - Parafilias e suas representações na mitologia grega
Nuno Simões Rodrigues
11 Fev: O corpo e a sexualidade: entre Mouros e Cristãos
Maria Filomena Lopes de Barros
18 Fev: Sexualidade na Idade Média: o fruto permitido e o fruto proibido
Ana Maria Rodrigues
25 Fev: Filhos da castidade e do pecado - Afectividade e enjeitamento na antiga sociedade portuguesa
Maria de Fátima Reis
4 Mar: De Eva a Dánae: representações da sexualidade na arte
Vítor Serrão e Luís Urbano Afonso
11 Mar: Sexualidade na época contemporânea: literatura licenciosa portuguesa dos sécs. XVIII e XIX
António Ventura
Informações Úteis: centro.historia@fl.ul.pt ou 217 920 000
Inscrições Abertas
Quanto a estes seus textos dedicados à Maria, são sempre muito reconfortantes de ler; de repente descobre-se que afinal os homens tambem têm sensibilidade e até sentem ternura e tudo:))).
Brincadeirinha! mas de facto gosta-se imenso destas suas ruminações...
Passei apenas para deixar um abracinho!
Gostei muito, mas fiquei preso no tricotar dúvidas monótonas.
A sua sensibilidade faz-nos sentir mais homens...
Obrigado!
"Espero que a A1 me devolva ao Porto."
Pensei isto muitas vezes durante o tempo que vivi em lisboa...
A minha próxima vida
Woody Allen (?)
A minha próxima vida, tenciono vivê-la de trás para a frente. Começar morto para resolver rápidamente esse assunto. Depois acordar num lar para idosos e ir rejuvenescendo na medida dos dias que passam. Ser convidado a saír, por ser demasiado saudável para o frequentar. Transitar, alegremente, dos proventos da aposentadoria para o mercado de trabalho, recebendo, meritoriamente, um magnífico relógio de ouro no primeiro dia. Trabalhar 40 anos, cada vez mais desenvolto e saudável até ao estádio universitário. Embebedar-me diariamente, ser bastante promíscuo, e caminhar até ao secundário, primário, todos estes percursos sem pressas, e por aí, até ser criança e brincar, só brincar, sem pensar na chatice da responsabilidade. Então, eis-me chegado quase ao dia do nascimento. Sou um bebé inocente, lindo e doce até ao primeiro vagido.
Finalmente passo, mais ou menos, 9 meses a flutuar na piscina aquecida de um "spa" de luxo, todos os serviços incluidos e a possibilidade de aumentar o espaço residencial a meu belo prazer. Tudo isto sem pagar um tostão! Depois - Voilà! - desapareço num orgasmo.
Professor, pedia-lhe que quando viesse a Lisboa, por ex para conferências, cursos, lançamento de livros etc, avisasse ou através do seu blog, ou pelo meu, ou email.
Gostava de o ouvir, pois sou da "mesma área". Obrigada
Estava a voltar a estas andanças e n pude deixar de vir cá dar uma saltada. Valeu-me a improvável regularidade quartziana do oscilómetro analógico do Boss para manter a Blogos como ponto de passagem. No fundo tudo passa por uma grande dose de pancas individuais, de quem ama e de quem (se deixa ser) amado. Esta coisa de amores perfeita ambi-tributários é coisa de outros tempo, eu diria mesmo e tempos em que amantes reais não tinham voz e sim a Voz canhota do Poeta. Voz magoada, humana, pouco preserverante e muito perceveja. E portanto falha em argumentos reais de estabilidades humanas. Quanto amor n se mantém agora por causa das ondas tormentosas do vil metal económico, e quantas, tanto se amando, n se separam enquanto por cá tervigerosámos sobre o prumo dos dias, a geometria da fantasia, contra os cristais aleatórios da pobreza, que tudo assombram e cobrem.
Abraço e bom ano para todos...
Professor
De passagem também por aqui, e falando de partidas, se me permite deixo aqui, uma citação que muito gostei de lêr hoje, de António Vaz Pinto, e com a qual concordo plenamente:
"O consumo é o ópio do povo.Isso é que é verdadeiramente alienante. Não é o consumo do pão com manteiga, mas a ideia de que é preciso ter e consumir , cada vez mais para ser feliz "
Deixo aqui um humilde pensamento :
Injustiça, deturpação, violência, desrespeito, crueldade, serão princípios para que um qualquer ser humano possa viver , com a dignidade a que tem direito ?
Não, quando se é humilde e autêntico, pois a sua verdade´há muito já foi dita....
Assim , enquanto há Vida há esperança, logo, quando se está de perfeita saude mental e bem lucido....há que continuar a sonhar , sorrindo e acreditando sempre,que é possivel um mundo mais humano, e menos consumista.
Professor , obrigado
Boa noite! ;)
Sei que tem mais que fazer do que vir aqui partilhar "coisas". Mas faz falta, em especial à hora do lobo/café das pesquisas e sei lá de mais o quê..., coisas novas.
;P
"Nanem" bem
Vou passar por aki....nao gosto de fazer nada....nao sei escrever,mas se algum dia tiver que escrever escreverei....gostei deste canto e porque nao canto, vou ouvir vossa musica.... hoje é dia de meu aniversário, resolvi quebrar a regra, dei folga ao ocio,e comecei a escrver...estou cansada,de nao gostar de nada, estou cansada de nao fazer nada, pronto ......estou cansada de escrever....hoje é dia de sua majestade...nós em portugal nao temos nem reis nem festa de reis....confesso que me faz falta....sao já alguns anos neste vicio... alguem que gosta de ler este blogue deseja que todos os vossos sonhos sejam realizados no ano de 2009...e o prof faça o favor cá á gente....desça á terra e fale mais simplemente....até que volte ....
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