segunda-feira, outubro 26, 2015

Muito provavelmente...

Deus Triste

Deus é triste. 

Domingo descobri que Deus é triste 
pela semana afora e além do tempo. 

A solidão de Deus é incomparável. 
Deus não está diante de Deus. 
Está sempre em si mesmo e cobre tudo 
tristinfinitamente. 

A tristeza de Deus é como Deus: eterna. 

Deus criou triste. 
Outra fonte não tem a tristeza do homem. 

Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco' 

domingo, outubro 18, 2015

Precisava de vir aqui...

ÀS VEZES ENTRA-SE EM CASA COM O OUTONO

Às vezes entra-se em casa com o outono
preso por um fio,
dorme-se então melhor,
mesmo o silêncio acabou por se calar.

Talvez pela noite fora ouça cantar o galo,
e um rapazito suba as escadas
com um cravo
e notícias de minha mãe.

Nunca fui tão amargo, digo-lhe então,
nunca à minha sombra a luz
morreu tão jovem
e tão turva.

Parece que vai nevar.

© EUGéNIO DE ANDRADE 
Branco no Branco, 1984 

quinta-feira, julho 16, 2015

Lamentável competição...

Do que me importa ver a tristeza em seu olhar
Se meu olhar tem mais tristezas pra chorar
Que o seu...
Marisa Monte

terça-feira, junho 16, 2015

quarta-feira, junho 10, 2015

A caricatura.

Cena habitual - senhora da "minha colheita" sorri por lhe ceder a primazia no cruzar de uma porta, "vai-se tornando raro". Não sei, fui educado assim. Mas para lá de regras básicas interiorizadas rumoreja sonho utópico que me faz sorrir. Eu, que nunca usei um colete e jamais poria as mãos no fogo pela limpeza dos meus jeans, na mais remota das entranhas ainda aspiro a parecer-me com meu Pai, esse petit grand seigneur. Nas boas maneiras!, intelectualmente seria caso para internamento psiquiátrico imediato por baforada delirante:).

terça-feira, junho 02, 2015

A dúvida.

Hesitei muito antes de ver Still Alice (a tradução portuguesa não me parece feliz). Acabei por o fazer em casa, enroscado no sofá e na saudade. A parcimónia era justificada, o filme não se limitou a convocar a memória, também a culpa se espreguiçou. Não apenas a que me assalta quando me lembro das racionalizações que usei para não visitar mais vezes minha santa Mãe. Também a que me acusa por não me ter apercebido de sintomas precoces da doença. É verdade que ela me "obrigava" a concentrar a atenção na saúde periclitante de meu Pai, mas isso não justifica tudo, havia sinais que eu devia ter valorizado.
E ao aperceber-me de tal desleixo, pergunta lógica me assalta - tenho simplesmente medo de sofrer de Alzheimer ou receio merecer a sua chegada?

domingo, maio 17, 2015

Ou faça as duas coisas:).

O tempo é algo que não volta atrás.
Por isso plante seu jardim e decore sua alma,
Ao invés de esperar que alguém lhe traga flores...
William Shakespeare

sábado, abril 25, 2015

quinta-feira, abril 23, 2015

Vi tanta mentira andar à solta...

Eu Vim de Longe

José Mário Branco

Quando o avião aqui chegou
Quando o mês de maio começou
Eu olhei para ti
Então entendi
Foi um sonho mau que já passou
Foi um mau bocado que acabou
Tinha esta viola numa mão
Uma flor vermelha na outra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a fronteira me abraçou
Foi esta bagagem que encontrou
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
Pra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E então olhei à minha volta
Vi tanta esperança andar à solta
Que não hesitei
E os hinos cantei
Foram feitos do meu coração
Feitos de alegria e de paixão
Quando a nossa festa se estragou
E o mês de Novembro se vingou
Eu olhei pra ti
E então entendi
Foi um sonho lindo que acabou
Houve aqui alguém que se enganou
Tinha esta viola numa mão
Coisas começadas noutra mão
Tinha um grande amor
Marcado pela dor
E quando a espingarda se virou
Foi pra esta força que apontou
E então olhei à minha volta
Vi tanta mentira andar à solta
Que me perguntei
Se os hinos que cantei
Eram só promessas e ilusões
Que nunca passaram de canções
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
Quando eu finalmente eu quis saber
Se ainda vale a pena tanto crer
Eu olhei para ti
Então eu entendi
É um lindo sonho para viver
Quando toda a gente assim quiser
Tenho esta viola numa mão
Tenho a minha vida noutra mão
Tenho um grande amor
Marcado pela dor
E sempre que Abril aqui passar
Dou-lhe este farnel para o ajudar
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei pra aqui chegar
Eu vou p´ra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar
E agora eu olho à minha volta
Vejo tanta raiva andar a solta
Que já não hesito
Os hinos que repito
São a parte que eu posso prever
Do que a minha gente vai fazer
Eu vim de longe
De muito longe
O que eu andei prá aqui chegar
Eu vou pra longe
P´ra muito longe
Onde nos vamos encontrar
Com o que temos pra nos dar

quinta-feira, abril 09, 2015

O alívio.

Por vezes, o sorriso ironicamente aprovador de um filho dissipa a tristeza que veio para ficar. Boa noite, gente.

sexta-feira, abril 03, 2015

Minha Avó honrou o nome:).

Pesquisa e edição: DIRCEU CHIRIVINO | chirivino@correiodopovo.com.br

No dia 12 de fevereiro de 1912 não houve edição do Correio do Povo. Na época, o jornal não circulava às segundas-feiras.

Socialismo feminino

Talvez não haja, na época actual, uma outra mulher que tenha tomado parte tão activa na organisação dos movimentos revolucionarios, por toda a Europa, como a famosa franceza que os tribunaes de Milão descreveram como "a mais perigosa mulher da Europa".

Sorgue, como ella é conhecida em todo o Continente, não é somente uma mulher notavel, mas é tambem de uma familia distincta. É filha de Durand Gros, o philosopho francez, mais conhecido, talvez, pela fama de sua theoria do polyzeismo e do polychismo e por ter sido um dos precursores da escola dos psycho-therapeuticos.

Madame Sorgue é uma revolucionaria aristocrata, pois seu avô era o general russo Cripkoff e seu tio Istomine foi almirante em chefe da esquadra baltica e um dos mais leaes servidores da dynastia Romanoff.

Sorgue é uma mulher que reune a um cerebro de força excepcional uma certa franqueza de olhar infantil, que a torna muito attraente.

Aos 19 annos, entrou para o palco francez; d''ahi, passou a ser jornalista e, pouco depois, oradora e escritora revolucionaria, tendo, hoje, uma reputação internacional nas duas ultimas capacidades.

Tem ella sido a verdadeira perseguição da maior parte dos governos europeus e, em 1898, foi a principal cabeça do motim na politica portugueza.

Depois de ter encontrado com essa mulher, não é difficil acreditar-se nos factos que contam a seu respeito, em diversos logares da Europa, e na parte que ella tomou no Congresso da Imprensa Internacional, em Lisboa, o qual foi aberto nesse anno pelo mallogrado rei d. Carlos.

Todos os jornalistas que se achavam no Congresso levantaram-se para receber o rei; sómente a irreconciliavel Sorgue ficou assentada.

Quando d. Carlos passou perto della, sentiu um calafrio, como si houvesse tido o presentimento da terrivel catastrophe que lhe sobreveiu, alguns annos depois, na capital portugueza. Seu rosto empallideceu, suppondo que a terrivel Sorgue pretendia assassinal-o, e deu, por isso, ordem para que a prendessem, no Porto, o que quasi precipitou a revolução do anno passado, pois o povo obrigou as autoridades a soltal-a. O governo portuguez repelliu-a de Lisboa e mandou uma canhoneira escoltal-a até a saida do Tejo, porque a classe operaria tinha organisado uma enorme demonstração no rio, em sua honra.

Sorgue tomou parte na grande gréve de Parma e foi accusada de ter sido a causa do assassinato de Victor Emmanuel - o que ella nega.

Esteve, por isso, na prisão de Milão, mas foi absolvida.

Ultimamente, foi condemnada á prisão por um longo tempo, pela sua defeza do anti-militarismo - uma propaganda que foi proeminentemente identificada na França, com Gustave Hervé, o anti-militarista francez.

Uma vez, em Florença, mme. Sorgue proferiu um eloquente discurso revolucionario, enfrentando ás carabinas que os soldados lhe apontavam. Foi, tambem, a principal figura no celebre Exode de la Belfort, quando um enorme grupo de relojoeiros e trabalhadores de metaes declarou que morreriam, ou haviam de obter o pão. O governo mandou dois regimentos de cavallaria para impedir os excessos dos grevistas. A maneira por que essa destemida mulher poude, então, com a sua calma e energia dirigir milhares de homens furiosos e evitar que houvesse mortandade é de admirar, e parece um caso de romance.

Mme. Sorgue é ainda muito moça e bonita; alta, elegante e de apparencia completamente feminina.

O unico signal que denota, nella, a revolucionaria, é um pequeno bordado escarlate que orna todos os seus corpetes.

Seu busto, em Luxemburgo, feito por Denys Puech, está perfeito.

Notícia publicada no Correio do Povo de 8 de fevereiro de 1912.

P.S. Alguém me deixou no consultório uma planta com raízes aéreas. E de imediato pensei que o seu lugar era na árvore de meus Pais. Que me ensinaram a manter os pés na terra, mas a  jamais abdicar da cabeça nas nuvens.


quinta-feira, março 19, 2015

quinta-feira, março 12, 2015

Pois, a dignidade...

A Obrigação da Verdade

Quando olhamos um espelho, pensamos que a imagem à nossa frente é exacta. Mas basta movermo-nos um milímetro para a imagem se alterar. Aquilo que estamos realmente a ver é uma gama infindável de reflexos. Mas às vezes o escritor tem de quebrar o espelho — porque é do outro lado do espelho que a verdade nos encara. 
Estou convencido de que, apesar dos enormes obstáculos existentes, há uma obrigação crucial que recai sobre todos nós enquanto cidadãos: de com uma determinação intelectual inflexível, inabalável e feroz definir a verdade autêntica das nossas vidas e das nossas sociedades. É de facto uma obrigação imperativa. 
Se essa determinação não se incorporar na nossa visão política, não tenhamos esperança de restaurar aquilo que já quase se perdeu para nós — a dignidade do homem. 

Harold Pinter, in "Discurso de Aceitação do Prémio Nobel" 

quarta-feira, março 04, 2015

Léo e Rimbaud...

sábado, fevereiro 28, 2015

Verlaine. E a senha para o Dia D...

Chanson d'automne

Les sanglots longs
Des violons
De l'automne
Blessent mon coeur
D'une langueur
Monotone.

Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l'heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure

Et je m'en vais
Au vent mauvais
Qui m'emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.

quinta-feira, fevereiro 26, 2015

Meu Pai amava este poema.

Il pleure dans mon coeur

Il pleure dans mon coeur
Comme il pleut sur la ville ;
Quelle est cette langueur
Qui pénètre mon coeur ?

Ô bruit doux de la pluie
Par terre et sur les toits ! 
Pour un coeur qui s'ennuie,
Ô le chant de la pluie !

Il pleure sans raison
Dans ce coeur qui s'écoeure.
Quoi ! nulle trahison ?...
Ce deuil est sans raison.

C'est bien la pire peine
De ne savoir pourquoi
Sans amour et sans haine
Mon coeur a tant de peine !

quarta-feira, fevereiro 25, 2015

For murconics only.

My Own Life
Oliver Sacks on Learning He Has Terminal Cancer
By OLIVER SACKSFEB.
A MONTH ago, I felt that I was in good health, even robust health. At 81, I still swim a mile a day. But my luck has run out — a few weeks ago I learned that I have multiple metastases in the liver. Nine years ago it was discovered that I had a rare tumor of the eye, an ocular melanoma. Although the radiation and lasering to remove the tumor ultimately left me blind in that eye, only in very rare cases do such tumors metastasize. I am among the unlucky 2 percent.
I feel grateful that I have been granted nine years of good health and productivity since the original diagnosis, but now I am face to face with dying. The cancer occupies a third of my liver, and though its advance may be slowed, this particular sort of cancer cannot be halted.
It is up to me now to choose how to live out the months that remain to me. I have to live in the richest, deepest, most productive way I can. In this I am encouraged by the words of one of my favorite philosophers, David Hume, who, upon learning that he was mortally ill at age 65, wrote a short autobiography in a single day in April of 1776. He titled it “My Own Life.”
“I now reckon upon a speedy dissolution,” he wrote. “I have suffered very little pain from my disorder; and what is more strange, have, notwithstanding the great decline of my person, never suffered a moment’s abatement of my spirits. I possess the same ardour as ever in study, and the same gaiety in company.”
I have been lucky enough to live past 80, and the 15 years allotted to me beyond Hume’s three score and five have been equally rich in work and love. In that time, I have published five books and completed an autobiography (rather longer than Hume’s few pages) to be published this spring; I have several other books nearly finished.
Hume continued, “I am ... a man of mild dispositions, of command of temper, of an open, social, and cheerful humour, capable of attachment, but little susceptible of enmity, and of great moderation in all my passions.”
Here I depart from Hume. While I have enjoyed loving relationships and friendships and have no real enmities, I cannot say (nor would anyone who knows me say) that I am a man of mild dispositions. On the contrary, I am a man of vehement disposition, with violent enthusiasms, and extreme immoderation in all my passions.
And yet, one line from Hume’s essay strikes me as especially true: “It is difficult,” he wrote, “to be more detached from life than I am at present.”
Over the last few days, I have been able to see my life as from a great altitude, as a sort of landscape, and with a deepening sense of the connection of all its parts. This does not mean I am finished with life.
On the contrary, I feel intensely alive, and I want and hope in the time that remains to deepen my friendships, to say farewell to those I love, to write more, to travel if I have the strength, to achieve new levels of understanding and insight.

This will involve audacity, clarity and plain speaking; trying to straighten my accounts with the world. But there will be time, too, for some fun (and even some silliness, as well).
I feel a sudden clear focus and perspective. There is no time for anything inessential. I must focus on myself, my work and my friends. I shall no longer look at “NewsHour” every night. I shall no longer pay any attention to politics or arguments about global warming.
This is not indifference but detachment — I still care deeply about the Middle East, about global warming, about growing inequality, but these are no longer my business; they belong to the future. I rejoice when I meet gifted young people — even the one who biopsied and diagnosed my metastases. I feel the future is in good hands.
I have been increasingly conscious, for the last 10 years or so, of deaths among my contemporaries. My generation is on the way out, and each death I have felt as an abruption, a tearing away of part of myself. There will be no one like us when we are gone, but then there is no one like anyone else, ever. When people die, they cannot be replaced. They leave holes that cannot be filled, for it is the fate — the genetic and neural fate — of every human being to be a unique individual, to find his own path, to live his own life, to die his own death.
I cannot pretend I am without fear. But my predominant feeling is one of gratitude. I have loved and been loved; I have been given much and I have given something in return; I have read and traveled and thought and written. I have had an intercourse with the world, the special intercourse of writers and readers.
Above all, I have been a sentient being, a thinking animal, on this beautiful planet, and that in itself has been an enormous privilege and adventure.
Oliver Sacks, a professor of neurology at the New York University S


sábado, fevereiro 21, 2015

Ainda há gente a lembrá-la...

Maria Clara
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Maria da Conceição Ferreira Machado Vaz, filha de Guilherme Ferreira e de Sorgue Caetano Ferreira, nasceu a 5 de Outubro de 1923, na Travessa das Almas, freguesia da Lapa, em Lisboa. 
Em 1942, com 19 anos, já abrilhantava uma peça em cena no Grupo Dramático "Os Combatentes" de Campo de Ourique - onde era já famosa no ping-pong - deitando a casa abaixo com palmas sempre que interpretava as “suas” bonitas canções com uma voz da mais pura e cristalina água, por vezes a roçar o canto lírico.Pouco tempo depois, num concurso organizado pel'O Século, descobria-se que "Nasceu uma estrêla!" título d'O Século Ilustrado de 18 de Janeiro de 1943, a propósito do êxito sem precedentes alcançado pela jovem cantadeira na opereta "A Costureirinha da Sé", estreada no Porto em 8 desse mês e onde contracenava com António Vilar, Costinha e Luísa Durão, tendo estes últimos de lhe dar um empurrãozinho para ela conseguir entrar em cena...

Foi durante as sessões dessa opereta que Júlio Machado de Sousa Vaz, neto de Bernardino Machado e, na altura, quase professor catedrático, a conheceu e dela não mais se separou até que a morte o levou em 1999, com 90 anos. Embora o romance não tivesse sido muito fácil, pois, de início, Maria Clara respondia com bastante parcimónia aos convites do jovem professor universitário, casaram ainda esse ano, indo viver para a Rua Anselmo Braamcamp e, depois, para a Rua do Bolhão, no Porto, perto do famoso Mercado onde todas as vendedeiras sempre a trataram carinhosamente por Clarinha.

A 16 de Outubro de 1949, com 26 anos, foi a feliz mamã de um menino sensível e terno, que aos 10 ou 11 anos, muitas vezes a acompanhava aos espectáculos, escutando-a, embevecido, atrás dos bastidores. Que sempre foi ela a sua melhor amiga e conselheira até que a doença no-la roubou a todos, nunca fez segredo o seu filho Júlio Machado Vaz.

Maria Clara, além de ter actuado em numerosos espectáculos na rádio, em revistas e no teatro, gravou centenas de canções de variadíssimos géneros, entre fados, canções ligeiras, marchas, etc., entrando no coração de todos os que tiveram a felicidade de a escutar. Foi uma das “Rainhas da Rádio”. Do seu vasto reportório podemos destacar títulos como "Figueira da Foz", "Maria Severa", "Marcha do Outono", "Ó Zé Aperta o Laço", "Amor, Não Digas Não", "De Cá Para Lá", "Alfazema do Monte", "A Casa de Santo António", "Barca do Lago", "As Pedras Que Tu Pisas" ou “Canção de Tavira”.

No entanto, quando concorreu à Emissora Nacional, foi reprovada, talvez devido às ideias progressistas de seu marido, o qual tinha sempre o cuidado de a prevenir para não apertar a mão a certa gente... Infelizmente, Maria Clara não saberá nunca desta pequena homenagem. Aquando do falecimento do seu marido, querendo segui-lo e simultaneamente não deixar o seu filho e netos, o seu espírito partiu com o Dr. Júlio Vaz e deixou para trás o seu corpo entre o carinho dos seus.

Portal do Fado.


quinta-feira, fevereiro 12, 2015

Only for murconics.

Carta (Esboço)

Lembro-me agora que tenho de marcar um 
encontro contigo, num sítio em que ambos 
nos possamos falar, de facto, sem que nenhuma 
das ocorrências da vida venha 
interferir no que temos para nos dizer. Muitas 
vezes me lembrei de que esse sítio podia 
ser, até, um lugar sem nada de especial, 
como um canto de café, em frente de um espelho 
que poderia servir de pretexto 
para reflectir a alma, a impressão da tarde, 
o último estertor do dia antes de nos despedirmos, 
quando é preciso encontrar uma fórmula que 
disfarce o que, afinal, não conseguimos dizer. É 
que o amor nem sempre é uma palavra de uso, 
aquela que permite a passagem à comunicação ; 
mais exacta de dois seres, a não ser que nos fale, 
de súbito, o sentido da despedida, e que cada um de nós 
leve, consigo, o outro, deixando atrás de si o próprio 
ser, como se uma troca de almas fosse possível 
neste mundo. Então, é natural que voltes atrás e 
me peças: «Vem comigo!», e devo dizer-te que muitas 
vezes pensei em fazer isso mesmo, mas era tarde, 
isto é, a porta tinha-se fechado até outro 
dia, que é aquele que acaba por nunca chegar, e então 
as palavras caem no vazio, como se nunca tivessem 
sido pensadas. No entanto, ao escrever-te para marcar 
um encontro contigo, sei que é irremediável o que temos 
para dizer um ao outro: a confissão mais exacta, que 
é também a mais absurda, de um sentimento; e, por 
trás disso, a certeza de que o mundo há-de ser outro no dia 
seguinte, como se o amor, de facto, pudesse mudar as cores 
do céu, do mar, da terra, e do próprio dia em que nos vamos 
encontrar, que há-de ser um dia azul, de verão, em que 
o vento poderá soprar do norte, como se fosse daí 
que viessem, nesta altura, as coisas mais precisas, 
que são as nossas: o verde das folhas e o amarelo 
das pétalas, o vermelho do sol e o branco dos muros. 

Nuno Júdice, in “Poesia Reunida” 

quarta-feira, fevereiro 11, 2015

terça-feira, fevereiro 10, 2015

Mercadoria...

Fragmento do Homem

Que tempo é o nosso? Há quem diga que é um tempo a que falta amor. Convenhamos que é, pelo menos, um tempo em que tudo o que era nobre foi degradado, convertido em mercadoria. A obsessão do lucro foi transformando o homem num objecto com preço marcado. Estrangeiro a si próprio, surdo ao apelo do sangue, asfixiando a alma por todos os meios ao seu alcance, o que vem à tona é o mais abominável dos simulacros. Toda a arte moderna nos dá conta dessa catástrofe: o desencontro do homem com o homem. A sua grandeza reside nessa denúncia; a sua dignidade, em não pactuar com a mentira; a sua coragem, em arrancar máscaras e máscaras. 
E poderia ser de outro modo? Num tempo em que todo o pensamento dogmático é mais do que suspeito, em que todas as morais se esbarrondam por alheias à «sabedoria» do corpo, em que o privilégio de uns poucos é utilizado implacavelmente para transformar o indivíduo em «cadáver adiado que procria», como poderia a arte deixar de reflectir uma tal situação, se cada palavra, cada ritmo, cada cor, onde espírito e sangue ardem no mesmo fogo, estão arraigados no próprio cerne da vida? 
Desamparado até à medula, afogado nas águas difíceis da sua contradição, morrendo à míngua de autenticidade - eis o homem! Eis a triste, mutilada face humana, mais nostálgica de qualquer doutrina teológica que preocupada com uma problemática moral, que não sabe como fundar e instituir, pois nenhuma fará autoridade se não tiver em conta a totalidade do ser; nenhuma, em que espírito e vida sejam concebidos como irreconciliáveis; nenhuma, enquanto reduzir o homem a um fragmento do homem. Nós aprendemos com Pascal que o erro vem da exclusão. 

Eugénio de Andrade, in 'Os Afluentes do Silêncio'

segunda-feira, fevereiro 09, 2015

Ou princesa:))))).

domingo, fevereiro 08, 2015

quinta-feira, fevereiro 05, 2015

terça-feira, fevereiro 03, 2015

segunda-feira, fevereiro 02, 2015

Um bálsamo... Durmam bem.

domingo, fevereiro 01, 2015

A má consciência.

Recebido como um Avô estimado no Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca:). Na plateia predominavam médicos jovens, o que sempre me provoca um prazer especial. Mas não só, infelizmente...:(. Cada vez mais sinto que lhes falo de uma prática médica longe do seu alcance, devido a todo o género de constrangimentos. À porta, manifestação em protesto contra insuficiências ao nível dos Cuidados Primários...
Falei-lhes de Osler e Heisenberg. Talvez o segundo seja mais adequado, o primeiro franziria o sobrolho perante a realidade actual. Em contrapartida, não percebendo nada de Física, acho o mundo que nos rodeia um hino à incerteza.
Que Deus os proteja. E aos doentes...

quarta-feira, janeiro 28, 2015

Para o Thora, com carinho.

Nasceu-te um Filho

Nasceu-te um filho. Não conhecerás, 
jamais, a extrema solidão da vida. 
Se a não chegaste a conhecer, se a vida 
ta não mostrou - já não conhecerás 

a dor terrível de a saber escondida 
até no puro amor. E esquecerás, 
se alguma vez adivinhaste a paz 
traiçoeira de estar só, a pressentida, 

leve e distante imagem que ilumina 
uma paisagem mais distante ainda. 
Já nenhum astro te será fatal. 

E quando a Sorte julgue que domina, 
ou mesmo a Morte, se a alegria finda 
- ri-te de ambas, que um filho é imortal. 

Jorge de Sena, in 'Visão Perpétua' 

terça-feira, janeiro 27, 2015

Procuro-te

Procuro a ternura súbita, 
os olhos ou o sol por nascer 
do tamanho do mundo, 
o sangue que nenhuma espada viu, 
o ar onde a respiração é doce, 
um pássaro no bosque 
com a forma de um grito de alegria. 

Oh, a carícia da terra, 
a juventude suspensa, 
a fugidia voz da água entre o azul 
do prado e de um corpo estendido. 

Procuro-te: fruto ou nuvem ou música. 
Chamo por ti, e o teu nome ilumina 
as coisas mais simples: 
o pão e a água, 
a cama e a mesa, 
os pequenos e dóceis animais, 
onde também quero que chegue 
o meu canto e a manhã de maio. 

Um pássaro e um navio são a mesma coisa 
quando te procuro de rosto cravado na luz. 
Eu sei que há diferenças, 
mas não quando se ama, 
não quando apertamos contra o peito 
uma flor ávida de orvalho. 

Ter só dedos e dentes é muito triste: 
dedos para amortalhar crianças, 
dentes para roer a solidão, 
enquanto o verão pinta de azul o céu 
e o mar é devassado pelas estrelas. 

Porém eu procuro-te. 
Antes que a morte se aproxime, procuro-te. 
Nas ruas, nos barcos, na cama, 
com amor, com ódio, ao sol, à chuva, 
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te. 

Eugénio de Andrade, in "As Palavras Interditas" 

quarta-feira, janeiro 21, 2015

De tília:).

terça-feira, janeiro 13, 2015

Ao meu Velho.

segunda-feira, janeiro 12, 2015

sexta-feira, janeiro 09, 2015

Boa noite, gente.

terça-feira, janeiro 06, 2015

saudades da Provença...