domingo, fevereiro 10, 2013

"Nos teus olhos altamente perigosos" é um verso do caraças:).

Um Adeus Português Nos teus olhos altamente perigosos vigora ainda o mais rigoroso amor a luz dos ombros pura e a sombra duma angústia já purificada Não tu não podias ficar presa comigo à roda em que apodreço apodrecemos a esta pata ensanguentada que vacila quase medita e avança mugindo pelo túnel de uma velha dor Não podias ficar nesta cadeira onde passo o dia burocrático o dia-a-dia da miséria que sobe aos olhos vem às mãos aos sorrisos ao amor mal soletrado à estupidez ao desespero sem boca ao medo perfilado à alegria sonâmbula à vírgula maníaca do modo funcionário de viver Não podias ficar nesta casa comigo em trânsito mortal até ao dia sórdido canino policial até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual Não podias ficar presa comigo à pequena dor que cada um de nós traz docemente pela mão a esta pequena dor à portuguesa tão mansa quase vegetal Mas tu não mereces esta cidade não mereces esta roda de náusea em que giramos até à idiotia esta pequena morte e o seu minucioso e porco ritual esta nossa razão absurda de ser Não tu és da cidade aventureira da cidade onde o amor encontra as suas ruas e o cemitério ardente da sua morte tu és da cidade onde vives por um fio de puro acaso onde morres ou vives não de asfixia mas às mãos de uma aventura de um comércio puro sem a moeda falsa do bem e do mal Nesta curva tão terna e lancinante que vai ser que já é o teu desaparecimento digo-te adeus e como um adolescente tropeço de ternura por ti Alexandre O’Neill.

16 comentários:

rainbow disse...


Um poema de adeus muito bonito e triste.
Dizer adeus não é fácil,mas às vezes inevitável. No poema, o adeus parece partir de um falso pressuposto, que é o que ele sente que ela sente.


Contrapondo o poema:

O beijo

Olhaste-me
e levaste contigo
um pouco de mim.
Aproximaste-te,
olhos nos olhos,
os corações descompassados,
a minha mão no teu cabelo
E a minha boca, rendida.


Um bom domingo para todos

Caidê disse...

Do caraças:), também acho.

É que o Amor exige uma vida emocional. Uma vida emocional que vai querer respirar por todos os poros.

Se nothing compares to love, nada se compara à paixão.

Um Amor não pode sobreviver sem paixão dentro. E esse é que é o busilis. O Amor não é uma coisa engomadinha, conserva sempre o seu ar amarrotadinho. Se no Amor não há loucura deixa de ser tão extraordinário. Se já não há extraordinário no Amor ...

Vá que me fico pelo cinema este fim de semana :)))

andorinha disse...

O poema é lindo!
Embora aqui não pareça poema...:)

Venho do outro lado e ia trazê-lo para aqui, quando me lembrei que já poderia aqui estar:)lol

Leio, releio e sinto-o na pele. Todo o poema é de uma beleza "infernal":)
Levei-o comigo para casa...

"...até ao dia que não vem da promessa puríssima da madrugada mas da miséria de uma noite gerada por um dia igual."

Deus! Fico até arrepiada...

Estão aqui duas pessoas que tinham realmente que seguir caminhos diferentes. E ele vê-a partir e tropeça de ternura. Isto também é amor.

Lindo! Lindo! Lindo!

Dos mais belos poemas que aqui li. Ou que me marcou de forma tão profunda.
Obrigada:)

andorinha disse...

Rainbow e Caidê,

Continuação de bom domingo, meninas:)

Cê_Tê ;) disse...

Do caraças!!!

Manuel disse...

A NOITE-VIÚVA

Uma pequena angústia sentida nos joelhos
Como o bater do próprio coração
E é a noite que chega
Não a noite-diamante
Mas a noite-viúva a noite
Sete vezes mais impura do que eu
Em passo obsceno em obscena força
Minúscula perversa venenosa

Escrevo o teu nome
Noite de amor que de longe me defendes
Escrevo o teu nome contra a noite obscena
Que a meu lado espera seduzir-me
Levar-me consigo
À porca solidão onde trabalho
À insónia sem margens ao vinho solitário
Duma pequena angústia
Escrevo todos os teus nomes
Puxo-os para mim tapo-me com eles
Na noite da surpresa
Noite feroz da surpresa
Noite do amor atacado de perto e conseguido
Alto e convulsivo
Noite dos amantes deslumbrados
Iluminados pelo demónio mais puro
Noite como uma punhalada ritual no invisível
Noite da vítima-triunfante

Escrevo o teu nome a meu favor e contra
Esta noite este murmúrio esta invenção atroz
A que chamam o dia-a-dia
Estas quatro minúsculas patas
Venenosas da angústia

Escrevo o teu nome cruel
Puro e definitivo.

E agora cantado:

«Gaivota»: Amália (poesia de Alexandre O'Neill)
http://youtu.be/bhagDjqN_ww

«Formiga Bossa Nova»: Amália (poesia de Alexandre O'Neill)
http://youtu.be/F6zs5WKT-Pc

Grande poeta!

Caidê disse...

Manuel
Desta vez surpreendeste : raio!
Que poema! Que poema a vida se não é neutra de espectro emocional! Que poema o Amor que tem dentro vida emocional!
Não há Amor sem emoção - há?

Caidê disse...

Andorinha
Bom domingo e prolongamento. Vá que não só de emoções no futebol vive uma Mulher e arrisco que também não um Homem. É que decididamente há matérias em que não tenho ponto de observação para ser feminista. Eles são tão iguazinhos a nozinhas! :)))

Caidê disse...

Nozinhas era com "s" :)))

andorinha disse...

Manuel,

Obrigada:) Sem mais...

Caidê,

Cruzes! Emoções só as do futebol? E isso seria gente?:)

Boa semana:)

bea disse...

Já estava a pensar que o professor é um poeta excepcional; se bem que tropeçar de ternura pelo Alexandre O'Neill me estivesse parecendo exagerado.

Uma vez vi o Alexandre O'Neill na livraria moderna e nada faria supor naquele homem de rosto engolido pelos óculos, a deambular prateleiras, que ajeitasse tanta farpa lancinante.

Tenham uma noite boa. Precisamos todos de uma noite sem mágoa. Só noite. Para o dia poder haver. E sermos novos cada manhã.

bea disse...

Nunca somos novos cada manhã? não faz mal. Fica o desejo. a intenção.
Não serve? Mas é melhor que nada.

andorinha disse...

"Já estava a pensar que o professor é um poeta excepcional; se bem que tropeçar de ternura pelo Alexandre O'Neill me estivesse parecendo exagerado."

Tu és tão engraçada, Bea:)
Eu sei que já disse isto mil vezes, mas és mesmo.

E agora deixem-me ir dormir, caraças:))))))

Anónimo disse...

Present Future

http://eondoicologisteryphotography.blogspot.pt/#!/2013/02/present-future.html

Anónimo disse...

O que me estou a lembrar agora de O´Neill é a publicidade:

"Bosh é Brumm"

Lou Salomé disse...

O O'Neill era GRANDE.
(Só não gosto do formato poético ser aqui "amarfanhado" em prosa!