Mãe,
A saudade inunda os cemitérios. Também eu visitei um, impotente para evitar as lágrimas sofridas de amiga de mais de quarenta anos, a Mãe dela recebia-me como um filho, "e o Júlio o que quer lanchar?". Mais uma sombra luminosa que vem habitar este mundo interior que amiúde me distrai do outro, tantas vezes desprovido de qualquer interesse, "morto" ambulante e acéfalo:(. Toda esta gente, honrando os que fundaram e teceram as suas tribos, me merece um carinho respeitoso. Mas tínhamos razão, sabes? - é um extraordinário privilégio honrar-te por simplesmente aflorar o prado de Cantelães. Hoje, como todos os dias...
31 comentários:
Sem palavras, comovida, "apenas"...
Beijinho.
É maravilhoso quando o uso das palavras honra de forma tão serena os sentimentos que nos assolam, e que muitas vezes nos apertam por sermos incapazes de os expressar...
Eu tive as cinzas do meu pai em casa durante uns meses. E, apesar de muita gente achar "creepy", eu achava reconfortante às vezes dialogar com o pote de latão.. :) Agora, que os últimos átomos foram repostos no grande ciclo do universo, na sua viagem de regresso às estrelas (obrigado Sagan, pelo conceito!!), vai-se falando e espera-se a resposta produzida pelos meus neurónios responsáveis pela memória! :))
Eu moro em frente ao cemitério, e depois que o meu pai morreu conta-se pelo dedos as vezes que lá fui. Lembro-me de uma quarta-feira de manhã com céu nublado, uns meses depois de ele morrer, de fazer um desvio à sua campa numa ida ao pão. Sentei-me lá um bocado e reparei que em nada era diferente das vezes que me sentava no canteiro de minha casa, a fumar um cigarro pensativo.. :)
Beija o meu nome
Inscrito na lápide,
fria de um túmulo.
Coloca flores sob
a campa rasa,
a terra húmida.
Mas, se é neste lugar vazio,
que encontras a memória
de quem fui.
Então, de nada valeu
o amor que nos demos,
os risos que trocámos,
o calor dos nossos abraços.
Se é neste lugar vazio,
que encontras o que te falta,
para preencher o vazio
da minha ausência...
Então, teremos de viver uma outra vida.
Teremos de ser eternos, como eterno
é o amor que une as nossas saudades!
Lembrou-me: "Volver" do Almodóvar.
P.S. Bonita, a cara lavada do blog!
Oh Professor mas que bonita que ficou a página. A fotografia está lindaaaaa!:)
Thenewdo:)
Que curioso! a mim, nestes dias tambem me lembra muito o filme... se bem que os escritos aqui neste poste do Professor e do Thora me tivessem comovido particularmente.:)
Boa semana para todos.
Bart
teremos de ser eternos.
Senhor professor
pensei que era engano. Vou ver melhor,a estranheza desconcentrou-me: é um sofá cativante, imagino que, se nele sentados, estaremos dentro com a ilusão de estarmos fora. Mas não vemos os altinhos sob as folhas onde dormem as cobras; não ouvimos o restolho de passos,o outono a gemer, ai, ai que me pisaram, nem o inteiro abraço do vento,vem cá, despenteio-te o pensamento. escapam-nos conversas de árvore, a voz fininha das ervas que nascem para nada. Ok, desculpe as baboseiras, o seu é um local de privilégio. Será Cantelães? nome bom para contar histórias. Ah! perdemos foi o salvo conduto sobre a ponte :)
E somos bea... e somos!
Bart
o teu ponto de exclamação animou-me. Há dias assim, precisamos que alguém nos estenda um sinal, pega lá um ponto de exclamação, agarras desse lado que eu agarro deste. Um, dois três, uppsss, pesa muito.
A MORTE É A CURVA DA ESTRADA
A morte é a curva da estrada,
Morrer é só não ser visto.
Se escuto, eu te oiço a passada
existir como eu existo.
A terra é feita de céu.
A mentira não tem ninho.
Nunca ninguém se perdeu.
Tudo é verdade e caminho.
Fernando Pessoa
P.S. A página ficou muito bela.
Bea,
As cobras?????? Lagarto, lagarto, lagarto:).
Bart,
curti ao molhe o teu poema! Tens jeito na escrita pá! Fazes por encomenda? Tenho uma míuda que adora poesia mas eu só lhe dou na prosa, e mal! :)
Maralhal,
começou na Sic a série "Terapia", baseia-se numa série israelita e cada episódio corresponde a uma sessão com o psi. Já vou na terceira temporada (pirataria com força!) e isto rende..dá é tarde e a más horas: 1:30h!
Ah..também gosto da nova cara do murcon. Nem que seja por ser diferente! Batatas com bacalhau todos os dias também farta, poça! :D
Thora,
A que dia, pá?
Essas não são más horas, são boas horas:)
Também gosto deste novo look.
Ficou mais giro o bloguinho:)
Dá hoje..mas não sei em que dias dá mais. Via PUB hoje e foi de esquelha, e o no site da Sic não tem mais info's. É esperar para ver..
Podes sempre meter na sic e sentares-te no sofá a fazer malha até dar.. :) É o que eu vou fazer, mas não é malha.. :)
*esguelha
Thanks.
Garanto-te que malha também não é, tenho muito poucas dessas "qualidades" femininas:)))
Não ligues ao que pesa bea... quando formos muitos a segurar o mesmo ponto... de exclamação, vais ver... deixa de ter peso!
(outro ponto de exclama São)
;)
Thora, meu amigo, lamento desiludir-te mas, só escrevo, por inspiração. Por aí percebe-se que o "Avançando" esteja parado à um ror de tempo. Talvez, parar seja uma forma de avançar... talvez. Dizia um qualquer filósofo, tão qualquer como outro qualquer «Sempre que me sinto perdido, páro. Então, oiço uma voz interior que me diz... se páras estás perdido!»
Ora, pelos vistos, muitas são as formas de nos perdermos, mas acredita, se estás apaixonado por essa miuda, ela vai encontrar poesi na tua prosa... não pares de rimar prosando!
;)))
Professor
pensei nas cobrinhas vulgares,dizia Francisco de Assis que são criaturas de Deus. Muitas são tímidas e escondem-se de nós por medo.Se nos assustamos e damos um pulo para trás, elas avançam e não atacam; é provável que só o sentido mude na reacção. Inofensivas e compreensíveis. Nos campos portugueses julgo que não haver outras :)
Bolas, Bart, tens a mania de dar erros de propósito :)
Thora
obrigada pela dica da série. És um manancial de informações :)
Esqueceste que sou analfabeto, bea?!
Bartolomeu:)
«Sempre que me sinto perdido, páro. Então, oiço uma voz interior que me diz... se páras estás perdido!»
Pois é! tal qual:)
Por isso faça o favor de continuar a escrever.:)
Uma forma de nos perdermos, é pensarmos que já percorremos todos os caminhos possíveis, Menina.
Porém... sem explicação aparente, aparecem por vezes carreirinhos entre as ervas, que vão desembocar em novos caminhos...
let's see what happens...
;))
Bartolomeu
:)
;)
Bart,
estou apaixonado por várias miúdas, mas uma em especial mexe comigo. Às vezes gostava de conseguir por em palavras aquelas coisas que só os poetas põe..eu limito-me a vive-las! Ah..essa miúda por acaso já vive comigo há 6 anos..:)
Quando viverem juntos ha 60 anos Thora, ela continuará a apreciar a poesia que emana da tua prosa vivida, acredita.
Viver a poesia completa o círculo, e... quando a "coisa" que se sente é genuína, dispensam-se as palavras, quer em prosa, quer em rima.
Acredita, Thora!
Bart, :))))))
" Ouve. Há dias em que questiono os gestos mais simples. Respirar, o que é? Nesses dias, as metáforas fazem mais sentido do que beber um copo de água. O que é um copo de água? Um copo é feito de vidro e eu não sei de onde vem o vidro, transparente e frágil, duro, excepto perante o chão, excepto perante uma pedra. Alguém lhe deu a forma de copo, esse conhecimento foi ensinado através de gerações, há estranheza em tudo isso: nesse alguém desconhecido, nessa distância. Depois, há a água, essa substância que chove, oposta ao fogo, que atravessa organismos provisórios. Há o próprio acto de beber, que é uma necessidade fisiológica. Em dias, como hoje, tudo isso é absurdo, falta-lhe sentido, e as metáforas têm muito mais lógica, crescem do ar, ateiam-se num mundo invisível. Se procuro razões, acredito que somos mais importantes do que a nossa pele. Somos mais importantes do que os nossos pulmões.
Os nossos cabelos ficam mortos na almofada, há vassouras a varrê-los no soalho. Para nomear aquilo que comunica entre nós, precisamos de metáforas. Sei que entendes o meu inverno, vejo-o no reflexo dos teus olhos e, no entanto, não são os teus olhos que vejo. Falo dos teus olhos apenas porque esta é a linguagem da nossa condição, da nossa espécie, mas aquilo que temos para dizer e nos une é muito maior e mais importante do que a nossa condição ou do que a nossa espécie.
Por exemplo, damos a mãos. O que importa realmente não são as nossas mãos, feitas de ossos que aprendemos nas aulas de biologia, mas sim uma âncora de oceano. Quando damos as mãos, somos um barco feito de oceano, a agitar-se sobre as ondas, mas ancorado ao oceano pelo próprio oceano. Pode estar toda a espécie de tempo, o céu pode estar limpo, verão e vozes de crianças, o céu pode segurar nuvens e chumbo, nevoeiro ou madrugada, pode ser de noite, mas, sempre que damos as mãos, transformamo-nos na mesma matéria do mundo. Se preferires uma imagem da terra, somos árvores velhas, os ramos a crescerem muito lentamente, a madeira viva, a seiva. Para as árvores, a terra faz todo o sentido. De certeza que as árvores acreditam que são feitas de terra.
...
Por isto e por mais do que isto, tu estás aí e eu, aqui, também estou aí. Existimos no mesmo sítio sem esforço. Aquilo que somos mistura-se. Os nossos corpos só podem ser vistos pelos nossos olhos. Os outros olham para os nossos corpos com a mesma falta de verdade com que os espelhos nos reflectem. Tu és aquilo que sei sobre a ternura. Tu és tudo aquilo que sei. Mesmo quando não estavas lá, mesmo quando eu não estava lá, aprendíamos o suficiente para o instante em que nos encontrámos.
Aquilo que existe dentro de mim e dentro de ti, existe também à nossa volta quando estamos juntos. E agora estamos sempre juntos. O meu rosto e o teu rosto, fotografados imperfeitamente, são moldados pelas noites metafóricas e pelas manhãs metafóricas. Talvez outras pessoas chamem entendimento a essa certeza, mas eu e tu não sabemos se existem outras pessoas no mundo. Eu e tu declarámos o fim de todas as fronteiras e inseparámo-nos. Agora, somos uma única rocha, uma única montanha, somos uma gota que cai eternamente do céu, somos um fruto, somos uma casa, um mundo completo. Existem guerras dentro do nosso corpo, existem séculos e dinastias, existe toda uma história que pode ser contada sob múltiplas perspectivas, analisada e narrada em volumes de bibliotecas infinitas.
Existem expedições arqueológicas dentro do nosso corpo, procuram e encontram restos de civilizações antigas, pirâmides de faraós, cidades inteiras cobertas pela lava de vulcões extintos. Existem aviões que levantam voo e aterram nos aeroportos interiores do nosso corpo, populações que emigram, êxodos de multidões famintas. E existem momentos despercebidos, uma criança que nasce, um velho que morre. Dentro de nós, existe tudo aquilo que existe em simultâneo em todas as partes.
Questiono os gestos mais simples, escrever este texto, tentar dizer aquilo que foge às palavras e que, no entanto, precisa delas para existir com a forma de palavras. Mas eu questiono, pergunto-me, será que são necessárias as palavras? Eu sei que entendes o que não sei dizer. Repito: eu sei que entendes o que não sei dizer. Essa certeza é feita de vento. Eu e tu somos esse vento. Não apenas um pedaço do vento dentro do vento, somos o vento todo.
Escuta,
ouve.
Amor.
Amor. "
José Luís Peixoto, in Jornal de Letras (Junho, 2010)
É isso Thora... a metáfora!
No poema de "Mulher da Erva" Zeca Afonso canta «ha quem viva sem dar por nada, ha quem morra sem tal saber»
Uns, estão-se nas tintas em saber de onde provém a matéria de que é feito o vidro... outros pretendem conhecer de onde provém a consciência humana... Einstein, relativizou a cena mas, Guilherme Abana a Pêra, decretou;
TO BE, OR NOT TO BE: Essa é (ou foi???) a questõe:
Whether 'tis nobler in the mind to suffer
The slings and arrows of outrageous fortune,
Or to take arms against a sea of troubles,
And by opposing end them? To die: to sleep;
No more; and by a sleep to say we end
The heart-ache and the thousand natural shocks
That flesh is heir to, 'tis a consummation
Devoutly to be wish'd. To die, to sleep;
To sleep: perchance to dream: ay, there's the rub;
For in that sleep of death what dreams may come
When we have shuffled off this mortal coil,
Must give us pause: there's the respect
That makes calamity of so long life;
For who would bear the whips and scorns of time,
The oppressor's wrong, the proud man's contumely,
The pangs of despised love, the law's delay,
The insolence of office and the spurns
That patient merit of the unworthy takes,
When he himself might his quietus make
With a bare bodkin? who would fardels bear,
To grunt and sweat under a weary life,
But that the dread of something after death,
The undiscover'd country from whose bourn
No traveller returns, puzzles the will
And makes us rather bear those ills we have
Than fly to others that we know not of?
Thus conscience does make cowards of us all;
And thus the native hue of resolution
Is sicklied o'er with the pale cast of thought,
And enterprises of great pith and moment
With this regard their currents turn awry,
And lose the name of action. - Soft you now!
The fair Ophelia! Nymph, in thy orisons
Be all my sins remember'd.
Bart e Thora:)
O nível das conversas por aqui subiu consideravelmente!:)
Dois interessantíssimos textos.
Muito bem!:)
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