O Público de Domingo dedicava um artigo a duas séries de culto: House e Os Sopranos. Ambas têm o condão de me prender ao quadradinho mágico. Greg House foi "construído" com mestria pelo argumentista. Cínico, viciado em analgésicos, cáustico, transgressor impenitente, clínico genial, misantropo, lá no fundo um bonzarrão. Tudo o resto é pano de fundo, contra o qual se recorta o perfil dele. Foi bem salientado que a série só em aparência se debruça sobre a prática médica. Um Serviço de elite e a Instituição em geral nunca poderiam tolerar o personagem, desde logo pelo individualismo, impensável em tempos de sistemático trabalho de equipa. Dir-me-ão que os cirurgiões, por exemplo, sempre gozaram da fama de prima donnas. É verdade, mas como "casta", os virtuosos que executam as tarefas mais delicadas dentro do "sistema", não fora dele. House vive escarranchado no muro. É tolerado pela instituição e idolatrado pelos companheiros pela sua capacidade de diagnosticar a doença que habita o corpo de doentes que trata bem ou mal de acordo com o seu lábil humor (tão corrosivo que permite a gulosa identificação da nossa vertente agressiva). A barba, a ausência de bata, as sapatilhas, a ostensiva dependência criam a ilusão de uma espécie de "sonho americano" - com talento tudo é possível, mesmo numa das mais severas profissões. Até quando um dos seus doentes, polícia de profissão, o aperta, House pode contar com a lealdade da equipa e a simpatia do espectador. Pasme-se!, o "anarquista" do Hospital acaba por levar de vencida quem doa milhões de dólares mas exige a sua cabeça por razões formalmente aceitáveis. O artigo e quem para ele contribui acertam no alvo - House é uma transposição genial de Sherlock Holmes para o mundo da medicina, ela é apenas o cenário onde Hugh Laurie se move, nunca poderia ser o seu habitat real. Mas..., who cares:)? Eu não, delicio-me com episódio atrás de episódio, certo de que o primeiro diagnóstico nunca é o correcto e da bondade essencial - embora mais ou menos clandestina... - do herói, duro por fora e geleia por dentro, à boa maneira de John Wayne (que teve bem menos sorte com os argumentistas...).
Os Sopranos levantam outra questão. Mais geral, menos personalizada, para muitos de nós angustiante - a humanização do mal. O reconhecimento de que nos habita, a admissão de que um criminoso pode ser um pai tão preocupado e inseguro como nós, um filho cheio de nódoas negras, uma pessoa capaz da maior generosidade nos intervalos das selvajarias descritas como "simply business". Isto pia mais fino, estilhaça a visão a preto e branco que tranquiliza e estrutura o mundo de uma forma intelegível. Que importa se é falsa?:). Um dia destes voltamos a falar disto.
24 comentários:
A sexta série dos Sopranos está D-I-V-I-N-A-L. Momento alto deste primeiro episódio, Carmela a dizer com toda a sinceridade do mundo "Tony is not a vindictive man!!!" à Janice : )))))
Swell!
O Chelsea ganhou sem Drogba marcar, o que quer dizer que o papá aqui está 7800 euros mais longe da penúria e de viver debaixo da ponte.
Duas séries desfasadas da realidade? Talvez não, olhe que uma série Portuguesa do mesmo Género mas sobre o sistema Nacional de Saúde Português seria igualmente engraçado! Engraçado e feliz não pela clínica genial ou serviços de elite, mas sim pelas constantes listas de espera e pelo aproveitamento sistemático dos recursos do público para se operar na privada... Teríamos desde logo o individualismo Capitalista salvaguardado...
Retratavam-se logo os caças consultas que não têm palha na cama e resolvem hibernar numa boa noite gelada às portas de um qualquer centro de Saúde, isto somente para pedir uma receita para a gripe que adquiriram na espera pela dita consulta!!!
Criam-se assim verdadeiras Máfias de Favores médicos ou de enfermagem, em que o padrinho muda consoante o favor…
Junte-se a isto à falta de verbas, ou verbas mal gastas e temos uma Série Portuguesa com sucesso. Divirtam-se e boas leituras.
Ps: E Parabéns ao NOSSO Mourinho (pena foi ter ganho ao meu F.C.P)
Noise, será que o Doctor House também tirou a sua licenciatura na Universidade Independente ?
Para mim, o Dr. House é a negação da realidade. É uma (falsa) tentativa do sistema fazer ver que um gajo desalinhado até tem lugar numa empresa (aquele hospital é um exemplo acabado de uma instituição de saúde gerida numa lógica empresarial) desde que seja competente. Mentira: já vi muita gente altamente competente ser queimada por se negar a alinhar com o sistema.
Em contrapartida, os Sopranos são para mim o máximo. A minha mulher é que não pode com aquilo... diz que se trata de um ambiente "só de homens" e que até lhe mete raiva por isso mesmo. Continuo sem perceber muito bem porquê, mas ok...
Boa noite.
House é uma delícia, também eu devoro episódio atrás de episódio.
Os Sopranos nunca vi:(
Em que canal e a que horas, FDL?:)
andorinha 11:15 PM
Eu costumava ver no Canal 2, às 2ª feiras, mais ou menos entre as 23:00 e as 24:00. Simplesmente imperdível !!!
Também sou de opinião que o interesse do Dr. House estará mais no argumentista da série do que na eventual adequação com qualquer realidade. Muitos menos a portuguesa.
Os Sopranos, que já foram geniais, arrastavam-se na última série que vi na RTP2. Se melhoraram, ainda bem. Talvez seja desta que o Tony se safe com a psi...
Fora de lei,
Porque dizes "costumavas"?
Já acabaram?
O marx diz que "se arrastavam na última série"; o miúdo lá em cima diz que a sexta série está divinal.
Estou perdida:)))))))
O House, MD tem falhas graves no que toca, por exemplo, às competências dele e dos escravos, para efectuar certos procedimentos médicos, mas que é uma série belíssima, é!
Principalmente na última série, a parte médica tem sido um bocado descurada,o que é pena, mas o resto vai compensando!
Como vem sendo hábito, e para vos fazer inveja, dado que daqui a umas horas estará a passar na televisão americana, amanhã ou depois, terei o 18º episódio da 3ª série. :p
Boa noite
Apesar de não ver muita televisão, já vi ambas as séries e parecem-me ser dois bons exemplos que por diferentes razões saiem fora da abordagem habitual do chamado "politicamente correcto"...
Lembro-me que quando comecei por ver a série os Sopranos há anos, tambem e à semelhança da mulher do Fora-de-Lei, fazia uma leitura muito machista daquela sociedade. Machista mas chocantemente perigosa no que se refere ao estabelecimento das fronteiras dos valores assumidos pelas personagens.
Rigorosos e implacáveis no cumprimento duns valores mas completamente despidos de ética em relação a outros que e à luz dos direitos humanos nos são fundamentais.
A lógica continua a ser de integração e valoração mas cuja implementação tem apenas os limites da família e dos amigos.
Os matizes emocionais antagónicos que encontramos nas personagens são reflexo desse princípio; os valores éticos são válidos mas apenas para os que lhes são humanamente e familiarmente próximos...
Lembrei-me de outra coisa... Nos últimos episódios, o House tem levado umas pseudo lições de moral, que, sinceramente, me têm desmoralizado um bocado. Tudo bem, o House em termos de imagem e comportamento não encaixa no perfil de médico, embora eu conheça professores da faculdade de medicina de coimbra com comportamento pior. Agora, em termos ideológicos, e particularmente em termos de crenças religiosas não percebo o porquê destas lições...
Noise:)
Eh pá!!! tanto dinheiro....
E não pagas nada aqui ao Maralhal? nem um jantarinho nem nada?:))
"Até quando um dos seus doentes, polícia de profissão, o aperta, House pode contar com a lealdade da equipa..."
Professor, Falta-lhe ver mais uns episódios! Fale com o Noise, esse contrabandista:), que ele arranja-lhe os ditos sem necessidade de se deslocar à rua da madeira a um domingo (ou no dia seguinte a Espinho)!! ;)))))))
Os Sopranos são realmente imperdíveis.
Penso que o sucesso da série, para além de muitos outros atributos, está na brilhante ideia de nos mostrar um mafioso incorrigível com problemas de comportamento a ponto de necessitar de apoio psiquiátrico.
É esta aparente contradição que eu acho sugestiva.
E ainda bem que os produtores acederam às exigências financeiras do Tony após a série anterior.
Ainda sobre o nacionalismo:
"Se eu soubesse de alguma coisa que me fosse útil e fosse prejudicial à minha família, expulsá-la-ia do meu espírito. Se soubesse de alguma coisa útil à minha família e que à minha pátria não o fosse, tentaria esquecê-la. Se soubesse de alguma coisa útil à minha pátria e que fosse prejudicial à Europa, ou que fosse útil à Europa e prejudicial ao género humano, considerá-la-ia um crime, porque sou homem necessariamente, ao passo que sou francês somente por acaso." Montesquieu
Sócrates n'«Os Lusíadas»
As equivalências e os termos assinados,
Que na ocidental raia Lusitana,
Por cursos nunca antes frequentados,
Passaram ainda além dos seis dias da semana,
Em betão armado e pré-esforçado,
Mais do que prometia a desfaçatez humana,
E entre gente bem mais douta edificaram
Novo currículo, que tanto sublimaram;
E também as notícias gloriosas
Daqueles feitos, que foram omitindo
A Lisura, a Hombridade, as Virtudes valerosas
Das corporações que foram destroçando;
E aquele, que por obras viciosas
Se vai da lei da respeitabilidade libertando;
Sobranceiro, entre pares, no plenário,
Cantarei, se a tanto me ajudar o engenho sanitário.
Thora,
"Fale com o Noise, esse contrabandista!"
Miúdo, não insultes o miúdo:))))
Fora de lei,
Coitado do Camões. Os Lusíadas agora servem para tudo:)
Mas está bem esgalhado...
Caro Dr. Júlio Machado Vaz,
Esta manhã, ao chegar a uma empresa, ainda tive tempo de ouvir o seu programa matinal na rádio.
Ao ouvi-lo, recordei-me de imediato que eventualmente poderá saber encaminhar esta minha preocupação.
Este fim-de-semana, numa aldeia do norte, tive conhecimento indirecto de um eventual caso de violência doméstica que se prolonga já há alguns anos.
Pelos vistos a vítima, a esposa, terá sido levada ao hospital à cerca de 2/3 anos. Aconselhada pelo pessoal do hospital terá apresentado queixa que retirou, passados alguns dias.
Entretanto, informaram-me que a vítima retirou a queixa porque, como é doméstica e não tem rendimentos, receia que se o marido for "tratado como deve ser", a Segurança Social lhe venha retirar os dois filhos por incapacidade de os sustentar.
Será que existe este risco? Será que uma mãe que trata os seus filhos como MÃE pode ver a guarda dos filhos retirada pela Segurança Social? Se esta possibilidade for real, então a situação é medonha, para esta e muitas outras vítimas, obrigadas a suportar um criminoso, por amor aos filhos.
Não se pode fazer nada?
Ainda argumentei com o Rendimento de Inserção Social, mas disseram-me que entre meter os papéis e começar a receber podem ir de 9 a 12 meses, o que não resolve o curto-prazo.
Não se pode fazer nada?
A ameaça é mesmo real?
São 2 excelentes séries! Quando ouço as respostas do House, não consigo evitar de pensar "Ah... se um dia eu chegar a ser grande, quero dar respostas assim!"
para quem não sabe os sopranos dão no hollywood e dr house dá a deshoras, gosto dos dois , se bem que mais do dr. house , realmente aquilo nos nosssos hospitais estava de atestado psiquiátrico há muito tempo , já tinha sido cilindrado pela maior parte dos chefes de serviço, o prof. desculpe mas se pensar bem nos seus colegas directores de serviço diga lá se conhece algum que suportasse um médico assim lá dentro , era fusilado e recambiado par o teatro anatómico em três tempos , os chefes gostam muito de quem lhes diga amem.
adorei a dos lusiadas e do socrates , só prova que ele é uma personagem importante com ou sem canudo
mp,
Obrigada pela informação sobre os Sopranos:)
Boa tarde,
E será que alguém via o Dr. House de secundário do Rowan Atkinson naquela pérola da tv inglela chamada Black Adder??
Bem melhor que o House!!!
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