quarta-feira, dezembro 04, 2013

Silêncio

SilêncioAssim como do fundo da música 
brota uma nota 
que enquanto vibra cresce e se adelgaça 
até que noutra música emudece, 
brota do fundo do silêncio 
outro silêncio, aguda torre, espada, 
e sobe e cresce e nos suspende 
e enquanto sobe caem 
recordações, esperanças, 
as pequenas mentiras e as grandes, 
e queremos gritar e na garganta 
o grito se desvanece: 
desembocamos no silêncio 
onde os silêncios emudecem. 

Octavio Paz, in "Liberdade sob Palavra" 
Tradução de Luis Pignatelli

12 comentários:

andorinha disse...


Tão belo, Júlio.
Não conhecia. Obrigada pela partilha.

Ficava aqui consigo no silêncio, mas não posso:)

Até loguinho...

rainbow disse...


Há silêncios de ouro, abrigos da alma e do coração.
Há silêncios mágicos, feitos de gestos cúmplices, de partilha.
E há os silêncios feitos de areia fina.


Ah, e ainda há os silêncios que, muito prosaicamente, resultam de afonia:)

E um sonho dentro dum sonho dentro dum sonho?

https://www.youtube.com/watch?v=cIk-Kxw_7Kc

Abraços a tutti
Até ao próximo oásis

Impio Blasfemo disse...

Há bastantes silêncios no nosso País. David Mourão Ferreira, entre outros escreveu sobre o silêncio

“Já o silêncio não é de oiro: é de cristal;
redoma de cristal este silêncio imposto.
Que lívido museu! Velado, sepulcral.
Ai de quem se atrever a mostrar bem o rosto!

…………………” (David Mourão Ferreira)

Não gosto muito de silêncios, diria mais que alguns silêncios me preocupam; lembram-me a morte e os cemitérios. E discordo de frases elegantes como por exemplo “E do silêncio tem vindo o que mais é precioso que tudo: o próprio silêncio”. Esta e outras frases equivalentes, por muito eruditas que o sejam, causam-me calafrios. Em oposição ao silêncio existe a cacofonia, o falar por falar, até à exaustão: - é igualmente arrepiante!
Talvez o saudável seja um bom mix de cacofonia e silêncios, com uma cereja no topo, para o batido ficar suculento. Bebido com palhinha, é do melhor, enfim, dirão alguns, é a vida….!
E por aqui fico em matéria de silêncios e cacofonia

E saravá para todos
IMPIO

bea disse...

Oh, desculpem interromper o vosso silêncio:) Boa noite a todos.

Ímpio

mas há silêncios tão bonitos! Que é isso? Os silêncios rancorosos, os amuados, os vazios, os difíceis porque se quer falar mas não adiantam as palavras, os que cavamos por sabermos que as palavras podem magoar mais e mais fundo; e há siLêncios confusos e honestos. E muitos mais de que me não lembro.

O silêncio do poema é agudo de triste. Não descansa ninguém. Mas é só um entre muitos.

Estão bonzinhos? se me ausento fico até com medo que chegue aqui e vocês não hajam. Bom, está cá tudo. Vá lá:)

andorinha disse...


Há silêncios mágicos e silêncios dolorosos. Gosto de silêncio. Faz-me falta no meio deste mundo aos gritos.


Rainbow,

A ouvir...não o silêncio, mas o concerto:)


"...se me ausento fico até com medo que chegue aqui e vocês não hajam. Bom, está cá tudo. Vá lá:)"

Pois, não te ausentes:)
Está tudo cá????
Falta tanta gente...


Impio,

Deixo-te um beijo já que não posso deixar um batido com palhinha:)))

andorinha disse...

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.

Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.

E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.


- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.


Herberto Helder, Sobre um Poema

bea disse...

Andorinha

tu não me leias com esses olhos de ver tudo, tá bem? tens que fazer um bocadinho de vista grossa aos exageros a que sou atreita.

"estão cá todos" é uma forma de dizer; significa que há por aqui gente. Tu bem sabes que todos, todos, é muito impossível de estarem.


Impio Blasfemo disse...

BEA
O tema do silêncio é, quanto a mim, um tema multifacetado. Se o que penso estiver certo, se calhar, analisá-lo ou dissertar sobre ele à luz de um poema é, provavelmente , falar de uma das faces do silêncio, esquecendo as outras. Assim, se tentarmos a poesia como forma de abordagem do tema silêncio, provavelmente precisaríamos de uma boa panóplia de poemas sobre o tema silêncio. E talvez aqui distinga duas abordagens possíveis:- uma que olhando para o nosso “eu” discursa sobre o silêncio do “eu” e outra que olhando para fora do “eu” analisa o silêncio do “colectivo” ou se quiseres, “dos outros”. E embora esteja de acordo que possam existir “silêncios muito bonitos” conforme referes, e decerto os haverá, a mim preocupam-me os silêncios “que não são bonitos nem feios mas sim preocupantes”, aquele silêncio que resulta da desistência, do desânimo.
Tenho conhecido, ultimamente, muitos destes “silêncios” e posso garantir-te que de bonito, têm muito pouco.

Abraço
IMPIO

bea disse...

eu acho que tens razão ímpio;

durmam bem

andorinha disse...

Bea,

Eu sei, "todos" seria impossível. Mas dos mais próximos falta gente. E sinto-lhes a falta, acredita.


Impio,

O silêncio da desistência, da desilusão é medonho, concordo contigo.

Abraço

Fiquem bem:)

bea disse...

Tão bonito esse poema de Herberto Helder sobre a génese da arte poética, andorinha. Obrigada e um bom dia pati:)

andorinha disse...


Também achei bonito, Bea.

Bom dia pati também:)