sábado, agosto 06, 2005

Há sessenta anos, a rosa radioactiva...

Li hoje alguns artigos justificando a decisão de Truman de lançar as bombas atómicas de Hiroshima e Nagasaki. Por coincidência, na RTP1 passou ontem à noite um documentário com declarações de fontes russas e japonesas envolvidas no processo da rendição nipónica. E é muito difícil negar a interpretação de alguns intervenientes: as bombas serviram mais uma estratégia para a relação no pós-guerra com os russos do que fins militares. Com um Imperador que já enviara mensagens claras sobre o seu desejo de terminar a guerra através de canais diplomáticos paralelos, o que teria acontecido se Little Boy fosse lançado numa área não habitada? Francamente, não acredito que o lobby da guerra pudesse resistir à conjugação da vontade imperial e do horror de uma destruição verificável. Dois depoimentos me ficaram na memória: um japonês que descreveu um cenário dantesco de sofrimento humano e acrescentou que a beleza das cores estava para além do imaginável; e um dos aviadores americanos que comeu e bebeu alguma coisa, dormiu, passou o resto da viagem a ver os círculos de fumo que lhe saíam do charuto e mergulhou na festa organizada na base. Recordo um velho texto, de cujas palavras exactas e autor já não me lembro, que dissertava sobre as trágicas consequências dos seres humanos serem os únicos animais que, ao desenvolverem a tecnologia necessária para matar à distância, tinham tornado quase obsoletos os mecanismos inatos de inibição da violência íntra-espécie...

35 comentários:

Rui Diniz Monteiro disse...

Professor, infelizmente os seres humanos têm uma longa história mesmo pré-tecnológica de violência intra-espécie.
Sim, a tecnologia facilita, mas pessoalmente acredito que a principal causa desta violência está na forma como as crianças são tratadas. Depois, em adultas, tendem a reproduzir o que vivenciaram na infância, não sei bem porquê, talvez por ser o mais conhecido e seguro, ou por terem acumulado uma raiva imensa.
Sobre esta relação entre a educação de crianças e a violência na sociedade deixo aqui a referência de um texto impressionante que o Professor deve conhecer, mas que recomendo a todos os que nunca o leram, The History of Child Abuse, de Lloyd deMause: http://www.psychohistory.com/htm/05_history.html

A terminar: embora raramente participe, é sempre um prazer vir aqui ao seu blog e "entrar" nesta pequena comunidade que aqui se cria à sua volta.

CLÁUDIA disse...

Professor,

do seu post de hoje fica-me, principalmente, o contraste atroz entre o cenário dantesco e aterrador descrito pelo japonês e a beleza que nós não conhecemos e que ele refere ter encontrado nas cores nesse mesmo contexto.

Os opostos. Os extremos. Os contrários. Sempre a coexistirem. Sempre a conviverem lado a lado e a partilharem um mesmo espaço na realidade que conhecemos.

Cada um deles tornando muito mais intensa e aguda a vivência do seu avesso.

Continuação de boas férias!***

Anónimo disse...

jotakapa
Desculpe, mas não concordo consigo.
É, no meu entender, no facto de o Homem ser um animal racional, que se encontra a razão de todas as guerras. Não há notícia de ter havido guerras entre macacos, entre elefantes ou outros animais irracionais.
Os depoimentos referidos pelo professor, que me chocaram, são a demonstração cabal da racionalidade (des)humana.
No dia em que a humanidade se comportar apenas como uma mera criatura, tal como todos os outros animais, estou convencido de que as guerras e todos os seus horrores acabarão.

Anónimo disse...

Prof. JMV,

Também vi o documentário da RTP ontem, sobre as bombas atómicas de Hiroshima e Nagasaki e sua justificação, se é que é possível haver alguma, para tamanho genocídio!!!
Também retive em especial o depoimento do aviador americano que, depois de ter lançado a bomba, foi almoçar, dormir a sesta e fumar um charuto – considerei-o obsceno, no mínimo! Um homem sem “alma” – um patife da pior espécie, escória!
Sempre que vejo este tipo de comentários, quer sobre as bombas atómicas, quer sobre o Holocausto, por exemplo, a minha revolta reacende-se. Como é que essa gentalha continua impunemente à solta e a gabar-se?
O comentário do japonês relativamente à beleza inimaginável das cores, não sei, mas acho que a hipotética beleza se teria desvanecido da minha mente, face ao horror.
Os americanos já sabiam nessa altura da rendição iminente do Japão. Não têm vergonha!!! Depois acham estranho serem alvos do terrorismo e outras coisas. Quem sabe, o Japão não está a financiar o Bin Laden?
A raiva não me deixa racionalizar – vou ficar por aqui.
Saudações.
Débora

lobices disse...

...Kubrick, no seu maravilhoso "2001", disse exactamente quando começou a guerra dentro do espírito do Homem
...ele disse-o duma forma animal, de uma forma quase irracional, mas "nasce" aí o primeiro momento do saber que o "poder" sobre o outro é a única forma de sobreviver
...e, aquele símio, ao verificar que o osso tinha o poder de pertir os outros ossos, não só descobriu que ele servia para o bem (reduzir a pequenos pedaços os bocados maiores) como também para o mal, para destruir o "inimigo" que lhe vinha roubar as presas...
...desde esse momento (se assim se pode aceitar o começo da Humanidade) que o Homem sempre teve o conceito do bem e do mal para usar; o problema é que alguns homem dessa raça dita humana e racional, apenas vê o poder que esse "osso maior" lhe dá sobre os outros...
...hoje, na actualidade, o "osso" tem outra forma
...há 60 anos atrás a destruição em massa foi comprovada
...hoje, esperemos que não exista mais nenhum a dar essa ordem, seja de que lado for
...quando ela explodiu, estava eu há 5 meses na barriga de minha mãe

jchalana disse...

Sr. Professor…seria um privilégio poder chamar-lhe assim, por fontes mais directas mas infelizmente o Dr. Júlio não me conhece…apenas me posso dar como feliz telespectador assíduo do seu programa Estes Difíceis Amores…que felizmente são uma das poucas mais valias que restam na televisão portuguesa…também já li 3 dos seus livros…mas eu tenho sempre um grave dilema com livros, é tentador a forma como eu entro numa briga com eles visto ser sempre eu, o lado mais derrotado…consigo ficar preso em 2 ou 3 páginas por semanas a fio…à mistura de outros livros que contradizem o que li anteriormente…criando um veredicto não menos feliz, daquele que se propusera a mim no inicio…por isso é que digo!! porquê estar a conhecer gente nova se posso fazer a minha própria gente…não se assuste Dr. isto já faz parte dos meus radicalismos…e eu para que eles não fiquem chateados comigo proponho-me a fazer-lhes a vontade…quando o Rei faz anos…simplesmente cozinho os meus próprios textos.
Será que o Dr. Júlio me poderia conceder a honra em espreitar o meu blog e deixar um comentário como só o Dr. Júlio sabe fazer…ficar-lhe ia de verás grato…é só pena morar no Porto, porque senão bem que poderia ser um dos seus pacientes…
Tudo de bom para si.

RAM disse...

Caro PortoCroft,

Ontem dei comigo a (TENTAR) imaginar o Grande Chefe Indio a ouvir o Megamix :)))))))))))))))))))
Alguém lá devia estar a fotografar :)))))))))))))))))))

RAM disse...

"Recordo um velho texto, de cujas palavras exactas e autor já não me lembro, que dissertava sobre as trágicas consequências dos seres humanos serem os únicos animais que, ao desenvolverem a tecnologia necessária para matar à distância, tinham tornado quase obsoletos os mecanismos inatos de inibição da violência íntra-espécie..."

Engraçado... ontem, no "África Minha" essa era exactamente uma distinções feitas por Denys (Robert Redford) entre o animal-Homen e os restantes seres vivos.

PortoCroft disse...

Caro Prof. m8,

Assisti a um programa aqui sobre Hiroxima, não sei se o mesmo enlatado que passou na tv portuguesa, e também fiquei convencido que as bombas foram lançadas por outros motivos que não o forçar o fim da guerra com o Japão.

Em primeiro lugar, uma retaliação / vingança pelo ataque a Pearl Harbour. Depois uma prova de força para a União Soviética. Tivessem os soviéticos tremido, muito provavelmente, a Guerra da Coreia nunca teria acontecido.

O certo é que, ainda hoje, há quem sofra as consequências. E, o mais grave é que, as probabilidades de não terem sido casos isolados, não páram de aumentar.

É necessário que, nas Nações Unidas, especialmente no seu Conselho de Segurança, outros países possam ter assento e força para, não só credibilizar a Instituição, como proporcionar os equilíbrios necessários à paz.

ram;)))))

Sério que, quando estava a colocar a música no "server", me "bateu" essa. ;))))))

Carlos Sampaio disse...

Hiroshima tem todo o simbolismo da nova arma e de que, após ela, as guerras nunca mais voltariam a ser iguais.
Quanto ao massacre de civis, ela não tem de modo nenhum o honroso privilégio de caso único nessa guerra. Mesmo os "bons", chegaram a explicar e assumir como bárbarie Colónia e Dresden, por exempo?

Anónimo disse...

Heis-me aqui chegada, fresquinha aqui em Luanda, e não é que não só encontro um site cheio de ideias e pensadores como a minha música favorita, Planet of New Orleans, dos Dire Straits. Só pelos bons gostos musicais já merecia um beijo Sr. Murcon

Anónimo disse...

Prof. JMV,

Dirijo-me a si em particular, por o saber assumidamente benfiquista.
Terminou agora mais uma triste exibição do "Glorioso". Espero que se estejam a "guardar" para o Campeonato ...
A continuarem assim, faço um voto: Despedimento colectivo com justa causa, treinador incluído!
Quanto é que os meninos auferem? Não são avaliados pelo desempenho, porquê? Francamente ...

Saudações.
Débora

Pamina disse...

Boa noite JMV e Maralhal,

Recebi um e-mail do autor dum blog, que conheci recentemente, com um artigo de 1998 que ele transcreve no seu blog a propósito desta triste efeméride e que se integra bem tanto no post como no comentário do Portocroft(9.10).

"...A mitologia oficial norte-americana sempre justificou esta barbaridade alegando que as armas atómicas eram necessárias para forçar o Japão à rendição e para poupar as vidas de soldados americanos. E desculpa-se com os crimes do Império militarista japonês na sua guerra de agressão na Ásia. Que as explosões nucleares fossem necessárias para pôr fim à Guerra é desmentido pela insuspeita opinião de Churchill, que na sua história da Segunda Guerra Mundial afirma: "seria errado supôr que o destino do Japão foi decidido pela bomba atómica. A sua derrota era já certa antes da primeira bomba cair".

...Numa colectânea recente de textos históricos sobre o caso – Hiroshima’s Shadow, Pamphleteer’s Press, citada pela revista norte-americana The Nation – o General Leslie Groves, chefe do Projecto Manhattan (o Projecto norte-americano de concepção e fabrico das primeiras bombas atómicas) confirma esta tese, afirmando: "O verdadeiro objectivo da construção da bomba era o de subjugar os Soviéticos". Daí a "necessidade" de uma utilização "exemplar" da arma atómica, que mostrasse a todo o mundo o terrível potencial destrutivo de que os EUA eram (então) os únicos a dispor."

"...Os últimos meses (1998) desmentiram claramente a tese de que a "queda do Muro" haveria de pôr fim ao pesadelo nuclear. Os muito publicitados ensaios nucleares da França, China, Índia e Paquistão, os quase silenciados "ensaios sub-críticos" de norte-americanos e russos (que mereceram protestos veementes do Presidente da Câmara de Hiroxima, ignorados pela comunicação social mundial), a denúncia pelo Ministro da Defesa grego de que a Turquia está a construir armas nucleares (France Presse, 23.7.98), a conhecida – mas ignorada pelo amigo americano – posse de armas nucleares por Israel, o programa secreto do governo dos EUA para a construção duma nova geração de armas nucleares (The Guardian Weekly, 24.8.97) são tudo factos que confirmam que o perigo nuclear está na ordem do dia e que a luta contra as armas nucleares tem de tornar-se de novo uma prioridade dos povos do mundo..."

Pamina disse...

Quanto ao documentário da RTP, acho importante que tenha sido transmitido.
A melhor maneira de honrar as vítimas é não nos esquecermos delas.
A propósito de televisão, e ligando com as últimas considerações do post, penso que a televisão pode desempenhar um papel importante ao devolver-nos a proximidade da guerra, num tempo em que esta se conduz pelo carregar de botões.
É necessário que nos choquemos e nos indignemos. Durante a guerra do Vietname, as imagens que entravam pelas casas adentro através da televisão (a 1ª guerra "em directo") foram essenciais para motivar a opinião pública norte-americana contra essa mesma guerra.
Claro que esta exposição pode ter efeitos perversos, se nos servirem diariamente doses maciças deste género de imagens em todos os telejornais. Corre-se o risco de a certa altura elas nos parecerem tão banais que, em vez de despertarem mecanismos de repulsa, causem apenas a nossa indiferença.
Apesar de tudo, acho essencial que vejamos o que acontece a um ser humano, quando este é o receptor de um qualquer engenho destruidor enviado pelo simples carregar do dedo de um outro ser humano.

Pamina disse...

Há uma perversão ainda mais terrível do que a indiferença que mencionei acima e que consiste em encarar a guerra como entretenimento. "Vamos lá despachar a loiça, para irmos para a sala ver como vai a guerra." Julgo que, em certa medida, isto sucedeu com a 1ªguerra do Golf e com muitos dos conflitos e atentados mais recentes.
No entanto, continuo a achar que pode ser dissuasor vermos essas imagens. Tudo depende de como elas nos são "servidas".

noiseformind disse...

Em todas as questões que o Éme nos lançou procuro construir imagens que traduzam a complexidade de que para mim essas questões se transvestem. No caso japonês existem vários factores, mas parece-me pouco credível (e quem tem provas do contrário que as apresente) que a perspectiva do pós-guerra pesasse mais do que a situação de curto prazo. Pode ter sido mais um factor, numa máquina já a funcionar numa determinada decisão. Lamento imenso não sentir pena, em termos de contexto histórico, pelos japoneses, assim como não consigo sentir pena pelos alemães, mesmo quando li o retrato vívido de David Beamour de 900 e tal páginas dos últimos dias de Berlim, em que pelo menos 200 dessas páginas estão cheias de violações, muitas delas em grupo, assassínios de crianças e outras. Deve ser a minha falta de empatia racional que está a atrapalhar. A Rússia, por exemplo, era uma aliada da Alemanha até acontecer a invasão da UCrânia, Staline precisou de camiões americanos para fazer a guerra na frente Este, a produção de armamento nos últimos dias da guerra foi mais elevada do que em todos os outros anos... resumindo... a guerra caracteriza-se por ser um climax, eminentemente masculino, produto de uma impulsividade macha que nos puxa a observer com gáudio a supressão do antagonista. Ouvi aquela anedota involuntária de alguns comentários a dizerem que o tipo que lançou a bomba foi comer e celebrar, como se o contexto da guerra permitisse outra coisa que não isso. Esses homens são verdadeiros heróis pq estão do lado que permitiu a liberdade e a democracia. Lamento imenso se não embarco em revisionismos da história. OS complexos e por vezes contraditórios sinais da História mostram que não existem posições imutáveis. Esta questão da guerra é funcionalmente a questão das pessoas que não matam galinhas mas comem galinhas. Acham uma chatice tremenda a morte de 145.000 pessoas no contexto de uma guerra e cagam de alto nos milhões que morrem mensalmente da fome provocada por um sistema de troca injusta na qual se inserem e do qual beneficiam. Que belo, que higiénico, que bonito. Ás vezes acho que as pessoas andam à procura de qq coisa para sentirem pena, como forma de exorcizarem os seus fantasmas mais profundos. Só tenho pena que que não se tenha corrido a bombas nucleares a Rússia enquanto os americanos tinham a vantagem. Acabavam de vez com o problema e não tínhamos assistido à polarização do mundo em "certo" e "errado". Sim, é verdade, correr os russos À bomba por não serem uma democracia e nessa altura instituir que nenhum país não-democrático tinha o direito a sobreviver. Tão básico como isso, tão cegamente "americano" como isso. Países sem democracia, bomba em cima deles, todos. China? Bomba. Portugal? Bomba (pequena) ; ))))))))))))). O problema das democracias em lidarem com o terrorismo é precisamente a desproporção de meios usados por um lado e a desproporção do terror criado pelo outro. Quanto mais lentamente se demorassem as potências na Segunda Guerra Mundial mais demoraria a re-construção europeia, mais motivação existiria para institituir ditaduras de teor comunista na Europa devido À deslocalização de tropas para o cenário do Pacífico. 145.000 vidas? Nenhuma invasão de um país do Eixo saiu tão barata em vidas humanas. Não lamento; ))))))))

Um pouco como a "caridade" médica do post anterior:)))))))))))

noiseformind disse...

Dou o exemplo de Yi, o fundador da China. Estatisticamente nenhum ditador se aproximou dele em termos de brutalidade. o seu legado? A China como estado coeso e íntegro. Algum chinês olha para Yi como um monstro? Não. Recuso-me a olhar para os que nos garantem hoje o status quo com desdém pelas suas acções fundadoras.

Anónimo disse...

Empresários de todo o país, não produzam!
Trabalhadores de todo o país, não descansem o fim-de-semana!
Não deixem os incêndios estragar as férias do nosso Primeiro!

www.riapa.pt.to

RAM disse...

Caríssimos,

Desculpem transcrever post efectuado em casa própria.
Nada mais tenho a dizer.

Time: 8.15, 6/8/45
Place: Hiroshima


Confesso que o que mais me impressiona na decisão Norte-Americana relativamente à bomba atómica, não são os contornos, per si, que envolveram a decisão de proceder ao lançamento da "Little Boy" sobre Hiroshima.

Volatilidade temporal, consubstanciada em decisão política?

Terá sido o passado, o desejo de “vingar” Pearl Harbour que validou a bárbarie?
Ou o presente de então e os seus imperativos militares?
Outros escudar-se-ão no futuro eventual: foram imperativos geo-estratégicos no pós-guerra?

A volatilidade temporal, consubstanciada em decisão política...

Mas como justificar o deplorável denodo de largar "Fat Boy" sobre Nagasaki, 3 dias depois de registados os efeitos devastadores de Hiroshima?

Se Hiroshima pode ser vista como o paradigma da brutalidade da espécie humana, Nagasaki é, tão só e apenas, o paradigma do SADISMO da mesma.

Edgar Morin escreveu: “Necessitamos então de considerar a barbárie, não só a que o progresso ainda não conseguiu expulsar da civilização, mas também a produzida por esse mesmo processo de civilização. Pode-se até dizer que as novas formas de barbárie resultantes da nossa civilização, longe de reduzirem as antigas formas de barbárie, despertam-nas e associaram-se-lhes. Desenvolveu-se assim uma forma de barbárie racionalizadora, tecnológica, científica...”, que nos deu as deflagrações assassinas da Segunda Guerra, mas também a tortura e os ataques cirúrgicos e à distância.

“Ataque cirúrgico”: que infeliz conjugação de vocábulos...

Teria Freud razão quando considerou que o desenvolvimento da civilização moderna, conduzia ao recalcamento e inibição a grande profundidade da nossa barbárie mental, favorecendo a sua acumulação subterrânea, até ao limite em que rebentaria?

Relembro música, que tanto me acompanhou:

“Enola Gay, you should have stayed at home yesterday
Aha words can't describe the feeling and the way you lied

These games you play, they're gonna end it more than tears someday
Aha Enola Gay, it shouldn't ever have to end this way

It's 8:15, and that's the time that it's always been
We got your message on the radio, conditions normal and you're coming home

Enola Gay, is mother proud of little boy today
Aha this kiss you give, it's never ever gonna fade away

Enola Gay, it shouldn't ever have to end this way
Aha Enola Gay, it shouldn't fade in our dreams away

It's 8:15, and that's the time that it's always been
We got your message on the radio, conditions normal and you're coming home

Enola Gay, is mother proud of little boy today
Aha this kiss you give, it's never ever gonna fade away

Orchestral Manouvers in the Dark

. disse...

Olá pessoal, antes de mais bom domingo e boas férias :)

Noise,

embora genericamente me identifique com tudo o que escreveste, a última frase deixa-me algumas dúvidas. Não se trata de desdenhar as acções fundadoras dos tais que nos garantem hoje o status quo, trata-se da vantagem que esse olhar crítico, a capacidade de questionar e compreender o passado, nos pode trazer em termos de auto-consciência cultural e crescimento futuro. No fundo a tal velha história de aprender com erros passados. Não se trata de fazer deles monstros ou vilões póstumos, é simplesmente um caso de consciência histórica, ou pelo menos assim me parece.

Quanto ao caso do soldado americano que surge no documentário e tanta indignação faz surgir, honestamente custa-me acreditar que aquela reacção indiferente seja honesta. Acredito, isso sim, que num primeiro momento tenha sentido uma espécie de anestesia geral, mas a indiferença, sobretudo a longo prazo, parece-vos realmente plausível?

RAM disse...

Uma última adenda: ainda há sobreviventes: os "hibakusha"!
A eles dediquei o texto.

Pior do que esquecer os momentos, é esquecer as pessoas.

Anónimo disse...

Para o Ram das 12.11 PM:
- o que nos leva a ter a certeza que (ainda hoje) os americanos são os grandes culpados de tudo, ou seja, refugiam-se como vítimas para reagiram brutalmente e sem qualquer razão válida para tal (se é que existe ou possa existir uma razão válida para matar)

noiseformind disse...

Rosebud,

Como certamente reparaste a parte final era a demonstração do perigo do outro extremo que é a não existÊncia de memória ou qq sentimento de culpa ; ))))))))))))))) e não retratava a minha opinião pessoal

PortoCroft disse...

"...soldado americano que surge no documentário e tanta indignação faz surgir, honestamente custa-me acreditar que aquela reacção indiferente seja honesta."

Caro ram,

Como já disse, desconheço se vimos o mesmo documentário. Mas, pelo que vos tenho lido, sou levado a crer que o tal soldado - naquele momento - se sentiu indiferente por duas ordens de razões. Primeiro porque a mentalização a que um soldado está sujeito, permite essas insensibilidades. Depois porque, estou em crer, desconhecia o verdadeiro poder e as consequências da bomba que acabara de lançar.

Depois, quero apenas fazer um reparo. É preciso cuidado quando se fala de americanos. Os americanos carregam os nossos genes. Ou, como eu dizia a um superior meu nos USA: O sonho americano não é americano. É os sonhos de todos nós, transportado para as américas.

O povo americano é em nada diferente de nós. Quer paz, saúde, justiça e segurança. Se alguma coisa temos a odiar naquele país são os lobbies da Industria de Defesa.

noiseformind disse...

Porty,


Cheira-me a uma nova era nas sitcoms. Cheira-me...
Uma mulher de um típico subúrbio WASP da Costa Oeste que se mete a plantar e comercializar marijuana depois de enviuvar? Sounds funny, amanhã já digo como correu o primeiro episódio. Fiquem atentos a este nome "WEEDS"

noiseformind disse...

Para saberem mais um cadito desta série inalante... ;)

PortoCroft disse...

Noisy,

A marijuana é terapêutica. A preocupação dela é (deve ser) o bem da neighbourhood. ;))))))))

noiseformind disse...

Porty,

Mas isso foi o que me passou pela cabeça e nada mais. Apesar de estar apenas viciado em sexo heterossexual múltiplo aqui em casa muito já se enrolou com a minha benção e até o meu almofariz que tenho para preparar os curries (para aquelas misturas mais complicadas de PHP e outras cocktails que se inventam) já cedi a essas empresas. Mas não vamos estar aqui a falar muito disso senão o Boss ainda nos manda apresentar amanhã no CAT mais próximo ; ))))))))))))) (desde que a desintoxicação do meu vício não seja feita À base de marinheiros moçambicanos espadaudos... aliás... desde que não envolva nenhuma genitália masculina a fazer-se ao meu corpinho...)

PortoCroft disse...

Noisy,

Sabes lá tu, sob os efeitos do vício, quantos marinheiros moçambicanos, não desembarcaram já no teu corpinho. ;))))))

Faz como eu: Bebe café e fuma Marlboro. ;))))))

noiseformind disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
noiseformind disse...

A serem marinheiros moçambicanos, estavam muito bem disfarçados de universitárias afro-americanas ou então a marinha Moçambicana tem a maior taxa de transsexualidade pós-comissão do mundo ; )))))))))

Mas existe um site que testa estes limites da nossa heterossexualidade, chama-se The Bait Bus e normalmente eles alinham... apresentam-lhes uma mulher, metem-nos na carrinha, começam a curtir com a mulher, metem-lhes uma venda e na hora da mamada passa a ser um homem a "fazer o serviço". Quando constantam quem é que lhes está a mordiscar o instrimento fazem-se de grandes machos mas depois alinham que é uma riqueza.

Espero nunca me cruzar com esses tipos (deve estar seguro dado que para já andam lá pelos lados de Los Angeles)

PortoCroft disse...

Noisy,

Claro. ;) Até aposto que todos te diziam se chamar Maria Mutola. ;)))))))))))))))

Tens dias que me fazes lembrar o Maradona. E nem sei porquê... ;))))

Ah!... E antes que me esqueça... as francesinhas, mesmo que não comas, quem pagas és tu. ;)))))))))

(afinal nem é preciso o Visa, RAM) ;)))))))

Até logo.

RAM disse...

Caro PortoCroft,

"Depois, quero apenas fazer um reparo. É preciso cuidado quando se fala de americanos. Os americanos carregam os nossos genes. Ou, como eu dizia a um superior meu nos USA: O sonho americano não é americano. É os sonhos de todos nós, transportado para as américas.

O povo americano é em nada diferente de nós. Quer paz, saúde, justiça e segurança. Se alguma coisa temos a odiar naquele país são os lobbies da Industria de Defesa."

Plenamente de acordo.
Nada tenho contra o povo Norte-Americano. Muito pelo contrário. Tenho lá bom amigos e, se tudo correr conforme previsto, voltarei lá este ano para mais uma estadia.

Aliás, Angus Wilson, escreveu, num ensaio sobre a inveja, citado por João Lobo Antunes:
"[...] the most distressing, foolish Envy of our time - anti-americanism in Western Europe".

Partilho do ponto de vista.

Quanto às francesinhas... estou à espera! :)))))))
A ver vamos se o Noisy no meio de tanta actividade sexual profícua, consegue estar à altura do desafio ;))))))

Anónimo disse...

Porto Croftc

O seu comentário das 2:26 é excelente. Estas discussões seriam muito mais úteis se nos limitássemos a discutir a condição humana sem usar os carimbos da nacionalidade.

Anónimo disse...

Noiseformind,

Discordo genericamente dos seus comentários das 11:29 do post de ontem. Pela insensibilidade, talvez derivada da tenra idade.
Não sou anti nem pró-americana. Não tenho nada contra o povo americano, nem contra outro povo qualquer. Excepto, quando tendo a liberdade de votar, escolhem mal os seus dirigentes. A propósito, ocorre-me uma frase do Miguel Sousa Tavares:
“O que faz a força da democracia é o facto de ela ser o único sistema político em que o povo pode livremente votar contra si próprio.”
Sou seguramente anti-barbárie, anti-violência, anti-violação dos direitos humanos, venham de quem vierem – democracias, ditaduras …
Os fins nem sempre justificam os meios.
Não se podem, e sobretudo não se devem, cometer barbaridades em nome da democracia.
Para promover a democracia, matam-se inocentes? Que estranho conceito! Ao matar inocentes, a América, na prática, faz rigorosamente o mesmo que o terrorismo de Bin Laden. O procedimento é análogo.
Deverei concluir que é um potencial bombista? (Países sem democracia, bomba em cima deles, todos).
A comparação com as galinhas não me parece adequada – é uma questão de sobrevivência. Atenção, que os vegetais também têm vida …
Quem lhe disse que as pessoas que se insurgem contra a guerra e a barbárie, não se preocupam com a fome no mundo? Existe alguma incompatibilidade? Desconheço … Lamento a impotência de não poder alterar esse estado de coisas. Como já tenho dito, somos todos cúmplices.
Eu sei que é uma utopia, mas o que gostava mesmo era que não houvesse fome, nem guerras e que todos tivéssemos igualdade de oportunidades. Mas para isso, o ser humano não poderia agir em função dos sentimentos negativos que o integram: o ódio, a inveja, a sede de poder, a luxúria, etc. Teria que ser efectivamente racional …
Nas guerras não há vencedores, só vencidos.
Termino com uma citação de Gandhi: “Olho por olho, e o mundo acabará cego”.

Saudações.
Débora