Maria,
Mais um jantar no Círculo Universitário. Ao café, reparei num rapaz que transpirava desamparo, só tinha por companhia a lareira apagada (se te parece, com este calor…). Meti conversa - british até à medula; astrónomo devoto; brilhante por faro meu. Como lhe invejei a paixão do discurso!, parecia um espelho que devolvesse, por teimosia, o que fui há vinte anos. Falou-me de estrelas mortas, cujo brilho ainda nos chega. Percebes? Vemos uma estrela que já não existe. Não nego a lógica da explicação, mas cá dentro apenas o córtex aderia, não percebo nada de anos-luz, como posso ver o que passou? Segui o conselho do meu velho – fui sorrindo. E ele foi deitar-se, mais aconchegado pela minha atenção e pelo conhaque, depois de um inevitável shake-hands, calorosamente hirto.
Eu vim para casa. Para nossa casa. Estaquei, encadeado pela tua ausência. E olhando em volta, fiz o inventário das mil recordações que nos sobreviveram. Sabes? A astronomia é bem mais simples do que pensava:).
43 comentários:
Atão! Ninguém diz nada! Será que ningém sabe o que é viver com a luz de uma estrela morta? Acho que não, mas acreditem, ficava bem mais feliz se assim fosse.
Caro Professor:
Não sei se acho este texto que escreveu
triste se bonito?!?
E a dúvida atormenta-me, apesar d saber q os dois se podem sobrepor...
A morte das estrelas
Poeira e Cinza no fim de nada
Migalhas de ferro a arder
Parecem jóias
Sóis velhos nas franjas do mundo
A adormecer na fogueira cansada e branca
Tão branca
Algumas constelaēões
Estremecem
Como se fosse preciso
Suspender, por momentos,
a respiração
E nós tão longe
Sem poder
Fazer nada…
Sei!
Os psis podiam dar uma ajuda e passar os atestados de óbito às estrelas moribundas!
Júlio,
Não sei se será.Para mim, pelo menos...:)
"Estaquei, encandeado pela tua ausência".
Só por esta frase já valeria a pena ter lido o texto.:)
É linda, de tão significativa!
Não são só as estrelas mortas que ainda brilham; as recordações, quando são fortes, também nos conseguem encandear.Tanto que, por momentos, nem conseguimos ver mais nada. Estão lá, tal como uma estrela que já não existe.
Perdurarão sempre na nossa memória.
uma torrada de centeio e manteiga de soja, forrada a queijo da ilha.
uma pinga de branco de pias.
o resto de um cardhu aberto há mais de um ano - tristemente divinal mantenho-me lúcido (convencido).
Sem comparsa, sem estrela morta que vive. Será tudo sorte?
posted by - feedbacklisboa
JMV,
Como já disse, no outro dia, tenho gostado de ler estes episódios.
Em relação ao seu último livro, aparece-nos aqui a relativa "novidade" de um eu masculino, enquanto narrador.
Se bem me lembro, no Muros, para além das páginas do Jacinto, as outras personagens masculinas, incluindo Pedro, não falam na 1ª pessoa.
Sabe, concerteza, que tem muito jeito para dar voz às personagens femininas e julgo que os "eus" femininos têm sido predominantes nos seus livros.
Será que no próximo romance iremos ter um homem como narrador na 1ª pessoa?
Nestes textos, ele tem-nos aparecido anónimo, como se existisse apenas em função da sua relação com Maria, embora revelando, aqui e ali, alguns dados que nos permitem concluir que não só ele é muito parecido com Pedro, como a relação aqui descrita é também muito semelhante à de Pedro e Maria no Muros.
Em boa-hora deu voz ao "Pedro", pois tem escrito textos belíssimos, como o de hoje.
"Estaquei, encadeado pela tua ausência." Que frase fantástica.
Como certamente lhe dirão críticos mais abalizados do que eu, tais como a saudosa Lys, que suponho ser sua amiga e crítica literária, conseguiu já criar um estilo próprio, o que é fundamental para qualquer escritor.
Temos lido aqui textos que são "indubitavelmente seus".
Para quando dedicação total à escrita?
Desculpe ter ocupado tanto espaço.
Boa noite.
JMV,
Estive a ler o comentário da Andorinha e vi que tinha copiado "encadeado". Nem reparei quando li o seu texto, tal a palavra encandeado se enquadra no contexto.
Querida Pamina,
Venho agradecer-lhe o adjectivo "saudosa". Bondade sua.
Efectivamente JMV dá-me a honra de ser meu Amigo. E acertou quando disse que o próximo livro dele é um narrador de 1ª pessoa (querido Júlio, não estou a fazer inconfidência, pois não?)
Aproveito para lhe dar os parabéns pelo seu belíssimo blog de música.
E acrescento que a Andorinha (de quem gosto muito também) tem mantido sempre o contacto comigo.
Um beijinho para si
Pamina,
Pois, eu li encandeado.
Mas afinal é encadeado?
Assim, o meu comentário não faz sentido.:(
Júlio,
É encadeado ou encandeado?
Tenho que saber para fazer um comentário em condições.:)
Caro Professor:Será que posso atrever-me a fazer-lhe um pedido???Seria possível voltar ao seu antigo sistema de comentários???desde que mudou para este de "popup", não consigo abrir a caixa de comentários quando ultrapassam os 15/20 (hoje apanhei aqui uma vaga antes)fico com o meu pc bloqueado e já não consigo fazer mais nada (by the way-acontece-me o mesmo com os blogs do PortoCroft que usa o mesmo sistema).
Desculpe-me usar este espaço para fazer a reclamação,mas isto é uma espécie de me deixarem comer o bolo-(os seus magníficos textos) e depois me impedirem de lamber os dedos e repetir a dose :)))
E não vale a pena responderem-me (nem sequer para refilar comigo)já sei que amanhã já não entro mais nesta caixa :((((
Júlio, as etrelas estão em todo o lado, devolvendo-nos os reflexos do que e de quem amamos.
Caro JMV
Pelos vistos, obrigado pela confissão.
Já nem vou mais á igreja...
A comoção do texto e da resposta chegam para nos preencher o dia. Que emoção podem ter as estrelas e os homens que delas derivam.
Bons dias!
Não somos nós feitos do mesmo põ das estrelas?
Discordo da Cokas quando afirma "mesmo depois de desaparecerem verdadeiramente da nossa vida, podem continuar a abrilhantá-la por muitos anos". porque então não desapareceram ainda das nossas vidas ... :)
(*Exactamente pq é um blog de alguém com "peso visual" nos media)
Tenho pensado algumas vezes* sobre o facto de se dizer aqui, que este blog parece uma sala de chat.
Se este blog for considerado um "chat", no sentido negativo da palavra, então quem o afirma demonstra que não leu nenhum dos comentários feitos, talvez nem o próprio post. E aí a sua observação perde validade como opinião fundamentada.
De resto, eu acho excelente que este blog permita este género de chat, porque por aqui se "discute" de tudo um pouco, com um nível de tom bastante acima da média por comparação com alguns dos tais ditos chats.
Bons dias
---
Sobre o post...
Alguém que me era chegado "desejou" ter vivido o suficiente para ter visto os netos. Considerava que a memória da sua passagem por este mundo, seria mais longa dessa forma.
Embora entenda, acrescento que ainda que um dia a luz dessas estrelas se "esgote"... talvez nos perpétuemos nas acções a que demos origem... Um filme antigo, inocente, falava tão bem disso... "Do céu caiu uma estrela".
Somos o que provocamos, as águas paradas que revolucionamos, cada um à sua maneira... Mesmo os mais tímidos e silênciosos...
Os mistérios das estrelas
Mesmo depois de mortas algumas delas continuam a ser guias e referências para muitos.
Por outro lado existem já outras que agora ainda não são vistas e para muitos passarão despercebidas.
Muitas outras parecem ser as mais brilhantes mas não passa de uma breve e singular cintilação.
NOTA: Isto também pode ser aplicado à astronomia! ;-)
@zul disse: "Não somos nós feitos do mesmo põ das estrelas?" (tiráste-me o pão da boca, 'pal');)
Caro Prof. m8,
As recordações hão-de luzir na sua vida, enquanto dure.;)
Aos Prontuários:
Tiraste-me não tem acento, bem sei.;)
Hoje estou assim... Triste.Profundamente.
Penso. Ou se é rebelde ou conformista... Será que sou conformista?
Será que não quero perceber?
Não percebo. Confesso. De todo.
...............................
HINO
Esta manhã há
no ar a incrível fragrância das rosas do Paraíso.
Nas margens do Eufrates
Adão descobre a frescura da água.
Uma chuva de ouro cai do céu;
é o amor de Zeus.
Salta do mar um peixe
e um homem de Arigento recordará
ter sido esse peixe.
Na caverna cujo nome será Altamira
uma mão sem cara traça a curva
de um lombo de bisonte.
A lenta mão de Virgílio acaricia
a seda que trouxeram
do reino do Imperador Amarelo
as caravanas e as naves.
O primeiro rouxinol canta na Hungria.
Jesus vê na moeda o perfil de César.
Pitágoras revela a seus gregos
que a forma do tempo é a do círculo.
Numa ilha do Oceano
os cães de prata perseguem os cervos de outro.
Numa bigorna forjam a espada
que será fiel a Sigurd.
Whitman canta em Manhattan.
Homero nasce em sete cidades.
Uma donzela acaba de aprisionar
o unicórnio branco.
Todo o passado volta como uma onda e essas antigas coisas recorrem porque a mulher te beijou.
Jorge Luís Borges
Pois hoje estou feliz! Tive a auto-estrada só por nossa - feminina - conta. Será que os cavalheiros foram todos para o emprego de transportes públicos?!
...eu não gosto de falar das estrelas que já morreram
...gosto mais dce falar das estrelas que irão nascer
...é como o amor
...gosto mais do que vai surgir do que aquele que já não é
abreijos
Lobices,
Eu gosto de falar dos dois - dos que já foram e dos que estarão para vir.:)
...to "maria" at 11.30 AM:
...
...de certeza?... em que auto estrada é que andas?... de certeza que não foste por uma estrada secundária?... Uma auto estrada vazia?...
...nãaaaaaaaaaaaaaaaaaaa
Meio dia!
entrei de serviço.
ihihihihihihihihihihihihihihihihih
(quem? O maluco de serviço, claro)
ihihihihihihihihihihihihihihihihih
Este post de JMV lembra-me os encontros e desencontros que se vêm a comemorar, mais tarde, em ocasiões desencantadas.
Será o caso do dia 16 de junho em que se comemora o Bloomsday, data festiva dedicada a James Joyce e ao dia em que Joyce teve um encontro especial com sua futura mulher, Nora Barnacle, data que, em 1904, norteou “Ulisses”, protagonizado pelo personagem Leopold Bloom, do qual se extraiu o nome do evento, o Bloomsday.
Que tal comemorar os nossos encontros, fazendo-os ressurgir noutros?
...to "Lobices" at 12.06 PM:
...
...A1... Eu não disse vazia, disse só condutoras...
penso que "os" vieram de transp. públicos por vias da saúde;)
...e, nos seus passeios, que tropece em estrelas brilhantes, vivas e com umas belas e "rejuvenescedoras..."
Bons dias e sejam felizes, HOJE!
Para a Maria (12:50)
Acho que não se empresta humanidade a alguém.
Todavia, as excepções existem. Será que me pode emprestar um pouco dessa sua felicidade!?
Muito obrigada
Maria simplesmente que saudades!
Não te conheço , mas que raio!, gosto de ti, eu dou-te alegria. Estou a falar a sério.
Quem és tu? és aqui do Porto?
Realmente parece-me um texto muito triste, mesmod e meia-idade, datado, cansado, o homem sentado noite-dentro fazendo o inventário de recordações, lamento imenso que a sua pena esteja tão para aí virada, será jogada promocional para aproveitar nos escaparates o envelhecimento da população Prof?
Deixo-lhe desde já o desafio. Escreva um texto como se fosse um jovem licenciado de Psicologia de 23 anos, e mostre que a poeira deste texto não está entranhada em si:)
http://www.murcon.com/
ISto afinal já não é um blog... é um império!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
para Maria, simplesmente - 1:07 PM:
Com todo o gosto, no entanto, não empresto, dou! Sorria, pense como é linda. Sinta, saboreie, acaricie, veja com os olhos do coração, cheire o verão a chegar e agradeça, mas não a mim por favor,
Obrigada
Eh MAria... temos orgiazita lésbica em perspectiva. Eu muito gosto de saborear a minha MAria!!!
"Nunca se justifique. Os amigos não precisam, e os inimigos não acreditam"
Ditado Árabe
...to Diana at 2.51 PM:
...sabes Diana, eu sou um pouquito mais velho que o JMV
...quando chegamos "aqui" a pena dá para escrever a lembrança e a pena que temos dessa lembrança
...tentar escrever um texto como se fossemos jovens de 23 anos já é um pouco tarde e, mesmo que o fizéssemos, isso seria um puro exercício de escrita, uma pura ficção...
...claro que o desafio foi por ti lançado ao JMV e eu me atrevi a entrar na dança mas para dizer que prefiro a realidade à ficção e daí as minhas tetras serem saudosas das lembranças e não penosas numa realidade que já não é...
...por isso, as palavras que de dentro de "nós" saem, são paridas com dor mas ao mesmo tempo com um sabor especial, o sabor de se ter deglutido com calma todo o tempo do mundo pelo qual já se passou
...
Para ti MURCON (PROF)
Lamento
Ó, tudo é tão longe
e foi tudo há tanto tempo.
Creio que aquela estrela
está morta há mil anos,
apesar de ainda lhe ver a luz…
Rainer Maria Rilke
...to Maria at 12.50 PM:
...sorry...transportes públicos!... Entendi; sabes, esta cabeça já precisa de fosfato e eu não o tenho tomado; pois, eles foram neles para olharem os seios das meninas para bem da sua saúde
...não creio
...deve ter sido uma falha na tua visão; eles deixarem o seu carrinho para irem no machimbombo a olhar as mamocas? humm
...:))
lobices
Entendi-o - as palavras que de dentro de "nós" saem, são paridas com dor mas ao mesmo tempo com um sabor especial, o sabor de se ter deglutido com calma todo o tempo do mundo pelo qual já se passou -porque lembra a competência do desengano de Cioran.
ihihihihihihihihihihihihihihihihih
(vou sair de serviço)
ihihihihihihihihihihihihihihihihih
Diana
Alguém com 50 seria capaz de imitar as tuas frases?
E alguém com 23 anos imitaria a subtileza deste trecho do Outono em Pequim de B.Vian?
(...)
- Nunca mais tornarei a vê-lo - disse - Queria agradecer-lhe.
- De nada - disse o abade - há-de voltar, vai ver.
- Posso fazer-lhe uma pergunta? Já deve calcular qual seja... Porque é que usa essa sotaina?
O abade começou a rir baixinho.
- já esperava por essa... - disse ele. - Pois olhe, vou confessar-lhe: é o novo método.
- qual método?
- De provocação... - respondeu o abade (...).
- Já percebi... (...)
(.........)
O abade (...) apertou-lhe a mão e afastou-se, sem olhar para trás, dando grandes saltos para que o fato, ao cair, formasse na areia uma mancha escura com a forma de um sino. (...)
Boris Vian (1920-1959)escreveu com 36 anos Outono em Pequim, 1956, ed de Minuit, mas não tinha 'apenas' talento.
uma lareira apagada...continua a ser uma lareira! é uma metáfora do copo meio vazio ou meio cheio. lareira apagada pode sempre voltar a acender! eu nunca acendi a minha. sei que melhores dias virão, e celebrarei esse momento. quero guardá-la [e guardar-me a mim] para esse momento. espero que chegue... se não acontecer ao menos não me lamento de fogos já apagados!
e numa lareira apagada cabem sempre mais "fogos" do que numa já acesa!
e embora paradoxalmente, acrescento:
quase que podia encadar-me na minha lareira por "inaugurar", contadas tantas as vezes que já estive para a acender. de qualquer forma vivi momentos tão felizes em que a lareira deixava de ter essa importÂncia. mesmo que o tivesse feito, só pelas [boas]memórias ela continuaria acesa e a aquecer-me.
ouso dizer que uma lareira apagada também aquece... é a velha história do satre em "o ser e o nada".
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