quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Veremos o resultado final.

Aconselhamento só a pedido da mulher Susete Francisco

As mulheres que pretendam interromper uma gravidez até às dez semanas poderão requerer aconselhamento psicológico e apoio social, mas esta é uma escolha que caberá às próprias. "Acompanhamento facultativo" foi a solução encontrada por PS, PCP e BE na nova lei do aborto. A proposta foi concertada pelos três partidos na última semana e ontem entregue no Parlamento. O documento - mais detalhado do que foi inicialmente previsto pelo PS -, consagra a despenalização do aborto até às dez semanas, estabelecendo no artigo 142.º do Código Penal que a interrupção voluntária da gravidez (IVG) não é punível se "for realizada por opção da mulher, nas primeiras dez semanas da gravidez".Seguem-se as condições : os estabelecimentos de saúde (sejam oficiais ou reconhecidos oficialmente) ficam obrigados a "garantir em tempo útil" a realização de uma consulta. De carácter obrigatório,e na qual a mulher será informada sobre o acto clínico em si, sendo-lhe também transmitido que poderá requerer acompanhamento psicológico ou por uma assistente social durante o período de reflexão (que terá no mínimo três dias). Com carácter facultativo: apesar dos diferentes entendimentos sobre esta matéria no PS, na proposta ontem entregue a mulher pode dispensar este acompanhamento. Mas os estabelecimentos que pratiquem a IVG são obrigados a tê-lo, assim como têm de garantir encaminhamento posterior para uma consulta de planeamento familiar. A proposta estabelece também o dever de sigilo dos profissionais de saúde e a objecção de consciência.IVG antes do VerãoDe acordo com Osvaldo Castro, presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, a lei será debatida na especialidade a 7 de Março. Caso seja aprovada (e conta desde já com uma larga maioria), o mais provável é que suba a votação final global logo no dia seguinte - 8 de Março, dia da Mulher. A lei seguirá então para Belém e, após promulgação, o Ministério da Saúde terá 60 dias (o prazo inicial era 90, mas foi encurtado) para a regulamentar, organizando o Serviço Nacional da Saúde (SNS) para que dê resposta às solicitações. O que significa que a nova lei da IVG poderá ser implementada antes do Verão.Uma proposta "equilibrada"As negociações entre PS, PCP e BE iniciaram-se logo na primeira semana após o referendo, então ainda de modo informal. Já esta semana decorreram reuniões entre os líderes parlamentares dos três partidos, que acertaram o texto final. "Esta iniciativa - que é do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes - destina-se a criar as condições para a aprovação de uma lei o mais alargada possível", afirmou ontem o presidente da bancada socialista, Alberto Martins, acrescentando que o texto está "aberto à assinatura de outros deputados" - uma referência a nomes do PSD que votaram pela despenalização, mas que não foram chamados à elaboração do texto. Já quanto a eventuais alterações propostas por outros partidos, Martins referiu que a proposta será ainda discutida na especialidade. Mas o certo é que a maioria de esquerda não deverá acolher alterações substanciais. Até porque a proposta ontem entregue, como fizeram questão de defender Martins, Bernardino Soares (pelo PCP) e Helena Pinto (pelo BE) é uma tradução "equilibrada" do resultado do referendo de 11 de Fevereiro e que resulta de um "consenso" alargado. As mesmas palavras usadas por Cavaco Silva na semana passada, mas então sob a forma de "alerta".


Comentário - Estou completamente de acordo com o carácter facultativo do acompanhamento durante o período de reflexão. Tivesse eu o poder na "ponta da esferográfica" e sairia caro ao Estado a outro nível:))) - a consulta obrigatória seria efectuada - obrigatoriamente... - por uma equipa multidisciplinar. Passo a explicar porquê. A avaliação psicológica seria preciosa para despistar eventuais processos depressivos ou estruturas de personalidade que tornassem aconselhável um acompanhamento - facultativo, embora recomendado... - após a interrupção de gravidez, a ajuda possível não se esgota no indispensável planeamento familiar. E quanto à informação sobre apoios à maternidade, não considero os médicos o grupo profissional mais adequado para a propiciar. Estes dois exemplos simples chegam para explicar por que razão durante a campanha sempre falei de equipas multidisciplinares. Mas atenção! - responsáveis por acolhimento e consulta não directivos, e não por um "aconselhamento" paternalista, dissuasor mais ou menos encapotado da interrupção da gravidez, logo, violando a opção da mulher e, por arrastamento, o referendo.

16 comentários:

LR disse...

Professor, acho que tem toda a razão quando fala na multidisciplinaridade. Claro que o acompanhamento exclusivamente entregue aos médicos resultaria numa abordagem icompleta: os médicos (clínicos do foro) são por natureza (e obrigação ?) positivistas, detentores da verdade científica e intolerantes ou impermeáveis aos assuntos de espírito.
A "alma" - e a sua complexidade - precisa de ser lida por gente acreditada.

E claro, estou também plenamente de acordo com a sua ideia de que todo o paternalismo é de combater. O que torna a abordagem ainda mais difícil.

Agora, e quanto a outra coisa:
- Decerto a incapacidade interpretiva é minha, mas não há contradição entre o estar "... completamente de acordo com o carácter facultativo do acompanhamento durante o período de reflexão"... e o "...Tivesse eu o poder na "ponta da esferográfica" e sairia caro ao Estado a outro nível:))) - a consulta obrigatória seria efectuada - obrigatoriamente... - por uma equipa multidisciplinar..."?

thorazine disse...

"Mas atenção! - responsáveis por acolhimento e consulta não directivos, e não por um "aconselhamento" paternalista, dissuasor mais ou menos encapotado da interrupção da gravidez, logo, violando a opção da mulher e, por arrastamento, o referendo."

Este ponto vai ser muito difícil de controlar. Na minha opinião (que é baseada numa experiência mínima) muito poucos são os proficionais que conseguem ser imparciais deixando os seus pequenos tribunais fora do local de trabalho. ;((

angie,
penso que o professor concordaria num cenário prefeito, em que não havia espaço para dissuadir a mulher de fazer o aborto mas sim cuidar da sua saúde, física e mental. Posso estar enganado..como é obvio.. :)

thorazine disse...

ups...
*perfeito

(Política brasileira? Porque será? lol)

andorinha disse...

Boa noite.

A mim parece-me uma proposta semi-equilibrada:)

Existirá " a obrigação de "garantir em tempo útil" a realização de uma consulta de carácter obrigatório.
Agora esta consulta vai ser realizada só por um médico para abordar apenas , digamos assim, os aspectos técnicos da coisa?
É muito pouco. Claro que sou de opinião que esta consulta deveria ser efectuada por uma equipa multidisciplinar, constituída por psicólogos, assistentes sociais, etc, que pudessem esclarecer eventuais dúvidas da mulher e sugerir possíveis pistas a seguir; tudo isto, duma forma o mais isenta possível de modo a garantir que a decisão final da mulher é ponderada e LIVRE.

Quanto a "aconselhamentos" paternalistas estamos de acordo na necessidade de os rejeitarmos.

lobices disse...

...subscrevo

andorinha disse...

Angie,
Penso que não há contradição.
A consulta é obrigatória e o acompanhamento será facultativo.
Agora a consulta, em vez de ser realizada só por médicos, deveria ser realizada pela tal equipa multidisciplinar, faria muito mais sentido.
Penso que é isto...

Thora,
Eu não vejo as coisas dessa forma tão negra.
Os médicos e outros profissionais de saúde que vão trabalhar nessa área, à partida estão de acordo com a lei, uma vez que os objectores de consciência estão excluídos.
Sendo assim, não vejo que não consigam ser imparciais e estejam ali a agir no sentido de coagir a mulher a não abortar.
Poderá haver um caso ou outro, mas maus profissionais existem em todo o lado.

LR disse...

" A consulta é obrigatória e o acompanhamento será facultativo".

Se assim for (e parece que sim, lendo agora uma 2ª vez) então já faz sentido.
E também estou de acordo.

thorazine disse...

Revendo..concordo que a minha análise do texto em relação à obrigatoriedade não foi muito feliz. Sorry.. :P

andorinha,
acho que são mais do que eu queria que vão tentar demover a ideia de abortar e consequentemente mais mulheres vão fugir da próxima consulta e do aconselhamento..

CêTê disse...

Tivesse eu o poder na "ponta da esferográfica" e sairia caro ao Estado a outro nível:)))

O problema é esse!;]

Ainda bem que pensa assim, prof!;]

No mínimo, dos mínimos, dos mínimos, uma "consulta" informativa antes- Obrigatória sim- pois não se pretende uma decisão informada? Até poderia no limite ser feito um pack informativo com linguagem acessível para toda a mulher. Tipo bula digital animada e interactiva, visionada na companhia de 2 profissionais de saúde que podessem esclarecer dúvidas. Haveria assim um controle da mensagem a passar e possibilidade de a mulher poder denunciar interferência abusiva no aconselhamento.
Obrigatória sim a consulta após- sobretudo por razões de saúde e de prevenção.

Sigilo-obviamente-mas a criação de um banco de dados pormenorizado que não comprometa a identidade da pessoa mas que permita um estudo sério do fenómeno. Dados que possam ser tratados por quem estude o fenómeno após autorização de uma comissão ética .

Digo eu, que não poderia assinar a proposta de lei.

Abraços

bjcs

andorinha disse...

Thora,
Se isso vier a acontecer, terá que ser investigado, porque é inadmissível.
Se isso se vier a verificar, muitas mulheres irão apenas à consulta e desistem do "aconselhamento".
Depois virão os políticos dizer que afinal o "aconselhamento" não era necessário porque poucas mulheres a ele recorrem.
Já estou a imaginar o cenário, isto segundo as tuas negras perspectivas.
Eu ainda vou tendo alguma confiança na classe médica:)

thorazine disse...

Professor,
"parece uma linha de produção de salsichas?" LOLOL

Eu adoro estas suas piadas gastronomicas! ;)))

thorazine disse...

andorinha,
só resta rezar.. ;))

Julio Machado Vaz disse...

Angie,
Só cheguei agora a casa:(. Mas a interpretação da Andorinha das minhas palavras está correcta:).

fiury disse...

é lógico mas o facto de não ter sido ponto assente antes, que despertasse sensibilidade para essa lógica (no que toca à interdisciplinaridade) não me esperança nada que assim será:(

Manolo Heredia disse...

Eu fazia assim:
"Se você não abortar, tem direito a um empréstimo na Cofidiz, de 15000 euros, com período de carência de 12 meses e reembolsável em 6 anos, até ao seu filhinho ir para a escola!!!". O Estado paga os juros!!!
Os abortos caíam para metade!

MCA disse...

Não vejo qual é o problema das consultas "dissuasoras". Afinal, não andaram todos a dizer, durante a campanha, que eram contra o aborto e por isso votavam Sim? Não andaram a dizer que o objectivo da legalização era diminuir o número de aborots? Não houve muitas pessoas que votaram sim exactamente por acreditarem nisso?