terça-feira, janeiro 23, 2007

17.000...

Uma "pandemia evitável" que alimenta "um negócio obsceno" Fernando Madaíl
O aborto clandestino, defende Maria de Belém Roseira, "não é um problema de ordem pública, mas um problema de saúde pública". A deputada do PS até cita o título de um artigo publicado, em Novembro, na conhecida revista médica The Lancet, onde se definia aquele fenómeno como sendo, em países menos desenvolvidos, "a pandemia evitável".Ao apresentar, ontem, em Lisboa, o livro História do Aborto (Ed. 70), da autoria de Giulia Galeotti, para o qual escreveu o prefácio, a ex- -ministra da Saúde considera que se juntam, neste domínio, questões sociais, de saúde pública e jurídicas.Lembrando que as organizações internacionais fizeram sempre projecções sobre o aborto clandestino em Portugal, a defensora do "sim" recordava que o estudo que a Assembleia da República pretendeu lançar, ainda no tempo do Governo de Durão Barroso, era "tão complexo e profundo" que acabou por ter custos que exigiam um concurso público internacional - e, ainda hoje, está por iniciar. Neste momento, há o estudo da Associação Portuguesa para o Planeamento da Família, que teve uma "amostra representativa" e cujos resultados nos "interpelam de uma maneira brutal", revelando que se praticam cerca de 17 mil abortos por ano no nosso país.No entendimento da deputada, é a actual "solução legal que está a dar alimento a um negócio obsceno" como é o aborto clandestino. E, criticando vários aspectos da actual legislação, a ex-ministra refere que a lei só é aplicada às classes mais desfavorecidas ("ninguém consegue aplicar o Código Penal às portuguesas que abortam no estrangeiro"), só atinge uma parte dos intervenientes ("nenhuma mulher engravida sozinha") e só se aplica de vez em quando ("nada corrói mais um Estado de direito do que uma legislação criminal que não é aplicada").Admitindo que o aborto "não é nem nunca pode ser método de planeamento familiar", Maria de Belém considera que a melhor forma de debelar o "flagelo" é retirá-lo da clandestinidade. Até porque, conclui, no sistema de saúde será possível "identificar as mulheres que não querem abortar e estão a ser coagidas" pelo companheiro ou pelos pais.

9 comentários:

Paulo disse...

Não sou grande apreciador desta senhora (Maria de Belém Roseira), mas tenho que concordar com a maioria das coisas que ela diz neste texto…
E então se for possível “"identificar as mulheres que não querem abortar e estão a ser coagidas" pelo companheiro ou pelos pais” e já agora acrescentando patrões… Então aí sim, estávamos a caminhar no bom sentido…

lobices disse...

...também concordo com o que MBR diz

Afectos disse...

É isso mesmo: para se resolver uma qualquer questão há que fazê-la sair da clandestinidade. A obscuridade é um negócio sujo.

CêTê disse...

Cada vez mais me convenço que não sou uma mulher de fé.
Cada vez estou mais convencida que as motivações para mudar a lei se prendem mais com questões de fuga ao fisco do que mudar as razões que conduzem a mulher ao aborto.

Já não bastava ser do Benfica, professor (esta é a brincar!;))))... continuar do lado do inimigo? (agora a sério)
Olhe, srº Dr. que o Sócrates só pensa em euros- não pense, vez alguma, que as questões sociais são para ele mais importantes do que as económicas.

Tsstsss

Se a lei não mudar cuidado: no caso de abortarem passem cheques de 99 euros cada um até prefazer o total.

AQUILES disse...

Também eu estou pouco optimista em relação ao resultado, e à bondade, do referendo. E porque temo que a indiferença ganhe através da abstenção. E continuo a achar que ninguém aborda (o Noise aborda) os problemas graves a montante do aborto.
Mas é o país que temos. No dia 13 ou 14 de Fevereiro a hipocrisia social retornará à sua velocidade de cruzeiro.

andorinha disse...

Boa noite.

Também concordo com o texto, no essencial.
"...a melhor forma de debelar o "flagelo" é retirá-lo da clandestinidade."
Tenho dito:)))

TAF disse...

Permitam-me lembrar o que me parece essencial neste referendo.

1) É inquestionável que se trata de vida humana (sublinho que não estou sequer a presumir que se trata de uma "pessoa").
2) Essa vida tem algum valor, mesmo que o peso desse valor não seja consensual;
3) O que se pretende com a nova lei é abolir toda e qualquer protecção do Estado a essa vida até às 10 semanas;
4) O que se pretende com a nova lei é dar à mulher, com carácter de exclusividade (nem o pai?!), o poder de decidir terminar essa vida.
5) Passando a ser um direito da mulher, a sociedade, através do Estado, vai obviamente ser obrigada a colaborar com esse acto que ninguém defende como desejável.
6) Com a nova lei vão continuar a ser penalizadas as mulheres que abortarem a partir das 10 semanas.

Posto isto, quem vota SIM?

1) Quem não atribui valor suficientemente relevante à vida até às 10 semanas para que mereça protecção do Estado, quando em confronto com a vontade da mãe quaisquer que sejam as suas razões.

2) Quem acha que o pai não tem nada a ver com o assunto.

3) Quem não se importa que o Estado reserve recursos para ajudar quem pretende abortar, tendo que dar prioridade a estas situações face a casos de doença quando os prazos apertarem.

4) Quem acha que a partir das 10 semanas as mulheres devem ser penalizadas, porque todas vão querer abortar antes.

Um exemplo quanto a este último ponto. Uma mulher e o seu companheiro resolveram ter um filho. Ele foi concebido mas, à 15ª semana de gestação, ela e o companheiro zangaram-se e separaram-se. Ela ficou numa situação precária: além das dificuldades económicas de ter de suportar sozinha uma renda de casa, aquele filho já não é desejado. Quer abortar. Como é neste caso? Os SIMs já vão querer impor à mulher a sua opinião sobre se se justifica ou não o aborto? O que fazer, então? Deixar à consideração da mulher? Até que prazo? O nascimento? Ou proibir? Mas aí não se está já a violar o tal princípio de que a mulher é que sabe de si e da nova vida que carrega? Não haverá NENHUMA alternativa ao aborto?

Paulo disse...

Calma aí…
Já me manifestei por várias vezes contra esta história que refer aí nos pontos:

“…2) Quem acha que o pai não tem nada a ver com o assunto.
3) Quem não se importa que o Estado reserve recursos para ajudar quem pretende abortar, tendo que dar prioridade a estas situações face a casos de doença quando os prazos apertarem …”

Quanto ao ponto 2) já me manifestei contra a carga feminista da pergunta… Se bem que quem pensou nela, deve ter visto que infelizmente quem era sujeito sempre a julgamento eram as mulheres e não os seus companheiros (muitas vezes coniventes com esta história)…
Quanto ao ponto 3) também já aqui disse, que embora considere que a haver aborto legal ele possa ser feito em serviços de saúde públicos (principalmente por pessoas de parcos recursos), devem ser pagos pelos interessados (quanto mais não sejam só as despesas de referido acto), pelas mais diversas e variadas razões…
Quanto ao seu ultimo ponto, meu caro, se já é dado assente e confirmado de que pelo menos a partir das 10 semanas existe um Ser Humano e não apenas vida humana, então não há mais nada a dizer… É crime e ponto final… As devidas excepções para além desse prazo já estão previstas na lei…
Para além disso e levando as coisas mais a sério, após aproximadamente 2 semanas de gestação, já não há mais desculpas para não se começar logo a procurar uma solução para o “problema” (no caso de o ser, claro), pois numa mulher “normal” o alerta já foi dado… e quanto mais cedo o resolver melhor…

Fora-de-Lei disse...

"Até porque, conclui, no sistema de saúde será possível "identificar as mulheres que não querem abortar e estão a ser coagidas" pelo companheiro ou pelos pais."

Tás fora, Mariazinha. Hoje há muito mais mulheres a abortar contra a vontade do marido / companheiro / namorado do que o contrário...