terça-feira, janeiro 30, 2007
A propósito do debate.
Como alguns de vocês, também considero que Vital Moreira apresentou - de longe! - o discurso mais articulado da noite. A sua pergunta ao painel e à plateia sobre a denúncia do crime das mulheres e o silêncio que lhe respondeu, demonstra bem como esta lei não corresponde a um sentimento generalizado da população portuguesa. Nem sequer dos defensores do Não, atascados num labiríntico "crime sim, pena é que não", quando muito um "curso de reabilitação moral" - a expressão é minha -, através de trabalho comunitário, como ainda hoje o Dr.Bagão Félix repetiu. Mas para um psiquiatra o início do programa foi, desde logo, sintomático. O texto de Lídia Jorge era uma descrição de factos e ponto final. Pode haver quem ache que pintou a negro carregado para votante ver, como outros vituperam as ecografias do Não, mas dificilmente se pode "espremer" outras coisas dali. O texto de Rita Ferro era diferente. Porque todo ele apontava para a construção de um estereotipo: as mulheres, abortando por capricho e comodismo, grandes beneficiárias de uma eventual vitória do Sim. Ao longo de trinta anos ouvi mulheres com esta postura? Pouquíssimas. E devo acrescentar que nenhuma pertencia a classes económicas que receiem a aplicação da lei vigente...
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13 comentários:
Caramba…
O professor teimou que havia de me convencer a cair para um dos lados e não desiste… LOLOLOLOLOLOLOLOLO
Isto é um problema… "Concordo, mas não concordo… Com isto concordo, mas com isto já não concordo…" :-?
Concordo. Também penso que Vital Moreira fez as intervenções mais pertinentes no debate.
Gostei bastante da sua declaração final já em tempo de campanha.
Mas não é só para um psiquiatra que o início do programa foi sintomático; para mim também foi e não pertenço à área psi:)
Na altura registei logo isso: o texto de Rita Ferro todo ele realmente baseado em estereotipos, como se fossem aquelas as razões que levam as mulheres a abortar.
As mulheres são umas cabecinhas tontas que abortam por futilidades.
Houve outras intervenções que apreciei bastante,por exemplo a da médica pelo Sim e outras pessoas que referiram que votavam Sim por confiarem na capacidade de decisão das mulheres.
Parece que há gente, incluindo mulheres, que nos quer ver como umas coitadinhas, incapazes por si só de tomarem qualquer decisão.
Gostei também muito da intervenção da cidadã anónima, Lúcia de 26 anos que falou já quase no final no meio daquele grupo de jovens. Detestei o tom paternalista e convencido da psiquiatra que estava na plateia.
Paulo,
És sempre assim tão indeciso em tudo???:)))))))))))))
paulo,
Homem!, se pôe as coisas assim..., fecho o Murcon, não quero angustiá-lo:))))).
Para mim, a melhor intervenção de Vital Moreira foi aquela em que lembrou a todos que o Código Penal não serve para sancionar as nossas convicções morais. Dito de outra forma, nem tudo o que é moralmente condenável ou dificilmente aceite tem de ser crime. Deu os exemplos óbvios: o incesto e a tentativa de suicídio, nenhum deles é crime.
Por essa razão, o debate tem de estar centrado no plano jurídico-penal. Tenho observado alguma confusão no entendimento dos termos "despenalização", descriminalização" e "liberalização do aborto" ou aborto livre". É importante esclarecer este ponto: A palavra despenalização que está incluída na pergunta significa que o aborto até às 10 semanas deixa de estar sob a alçada do direito penal, isto é, não representa um facto ilícito criminal. Despenalizar ou descriminalizar em direito penal são exactamente a mesma coisa. De resto, outra interpretação é absurda, porque não existe crime sem pena de prisão. Pode, isso sim, haver uma pena alternativa, como é o caso da multa. Se o SIM ganhar, o aborto até às 10 semanas deixa de ser crime. E por que motivo os apoiantes do NÃO falam na liberalização do aborto? Pela razão de que a mulher já não precisa de invocar um motivo para abortar, ao contrário do que a lei actual exige. Acrescentam que neste caso não há nenhum bem jurídico que possa ser invocado pela mulher que afaste a ilicitude da sua conduta. Eu penso que eles se esquecem de um que me parece fundamental neste contexto: a liberdade da mulher.
O Prof. Vital Moreira fez um aviso muito importante, quanto ao pacote legislativo pós-referendo. Tenho aqui referido, várias vezes, a importância dessa omissão, como causa de alguma abstenção. Que deixa no ar a ideia de que, para os políticos (do SIM ou do NÃO é indiferente), não há clareza de intenções.
Só não me satisfez o facto do Prof. Vital Moreira não ter querido responder a Fátima Campos sobre quais as razões pelas quais considera grave (muito mal, nas suas palavras) que PS (governo e maioria) e PSD (principal partido da oposição) não o explicitem até ao dia do referendo.
Fica a ideia de que, com essa atitude, o Prof. Vital Moreira, continua a ser, essencialmente, um político e, como tal, "No comments" quando é conveniente para a classe.
Uma palavra também para as intervenções do Eng. Fernando Santos. Não me interessa tanto a substância, pese embora o seu radicalismo, ainda que alicerçado em convicções católicas e pessoais que me pareceram absolutamente genuínas, mas antes a importância e a veneração com que foi tratado por ser treinador do Benfica. Só que foi uma espécie de prenda envenenada, já que por detrás dessa reverência, estava um enorme paternalismo sobranceiro ao jeito de "deixa-o falar, coitado, é um homem do futebol..." Triste.
O comentário do JFR justifica que diga algo sobre o prof. Vital Moreira. Como estudante de Direito sempre admirei a sua erudição na área do Direito Constitucional. Foi-me muito útil. Ontem, apreciei particularmente a sua participação no debate. A gora, tenho de ser honesto e dizer que tem sido lamentável o seu papel de comissário político deste Governo e do PS, muito ao jeito do Vasco Graça Moura, até porque o prof. Vital Moreira não precisava deste comissariada para nada.
Andorinha (10:08)
Ohhh Andorinha… que estás a querer insinuar??? Hemmm!!! Ai, ai, ai… lololololololol
Júlio Machado Vaz (10:11 PM)
Oh professor… Mas é que nem pensar… lolololololol
Nem eu sou digno de tal cuidado… Prefiro viver angustiado e aprender mais umas coisas… :-)
Gonçalo (10.19)
É sempre bom termos aqui um jurista:)
Muito oportunos esses esclarecimentos. Já tinha entendido que "despenalizar" e "descriminalizar" significam o mesmo; tinha algumas dúvidas quanto à "liberalização" e fiquei esclarecida.
Do que vi do P&C, ficou-me a sensação de que se terá estado a falar seriamente. Aqui e ali alguma demagogia, impaciência, excesso de emoção, protagonismo extra, mas, acima de tudo, seriedade sobre o tema e a sua importância. Diria, até, que entrou ali pouca "política". Tirando, claro, Aguiar Branco, que veste sempre ministro.
Ora, considero isso ainda mais curioso porque as pessoas já estarão algo fartas de se ouvir. Umas às outras. Os do Sim e os do Não. Toda a gente já repetiu, vezes sem conta, aqueles argumentos. No entanto e tirando algumas excepções, como Vital Moreira, os protagonismos da novidade e/ou da frescura nas opiniões, vêm dos anónimos. Os consabidos "populares" na versão "reportagem no local do acidente".
Já mais transversal ao post, gostaria de pensar que todo este dinamismo, pura cidadania, não se ficará por aqui. Que pudéssemos continuar com esta preocupação e recuperar um outro referendo. O que fazemos de conta que não é necessário fazer. Tratar toxicodependentes. Indubitavel e consensualmente, vida. E, também, muito mal tratada.
gonçalo (10:19):
Estou de acordo com quase tudo que referiu. Duas excepções.
"...que o Código Penal não serve para sancionar as nossas convicções morais"
O erro é que ele referiu as nossas (de cada indivíduo). Mas é a moral social maioritária que vai formando o direito e as consequentes penas.
Quanto à tentativa de suicídio já não será moralmente condenável pela maioria social há muito tempo. Em Portugal. E quanto ao incesto, virá seguramente o dia em que será moralmente condenável pela maioria social e, então passará a ser punido pelo direito. Se ainda o não é, terá seguramente a ver com um passado em que era muito corrente e um presente em que continua a existir. Fruto, em muitos casos, de débeis condições sociais e morais e de algum alheamento da igreja na sua condenação, talvez pela consciência pesada de alguns Papas o terem praticado.
"Acrescentam que neste caso não há nenhum bem jurídico que possa ser invocado pela mulher que afaste a ilicitude da sua conduta. Eu penso que eles se esquecem de um que me parece fundamental neste contexto: a liberdade da mulher"
A liberdade individual não é um bem jurídico possível de ser invocado para justificar um nosso acto. O comportamento só poderá ser aceite se estiver dentro dos parâmetros da lei. Em qualquer contexto. É que, há sempre possibilidade de existirem outras liberdades que o direito deverá, igualmente defender.
Julguei que ia encontrar lá o professor, pelo menos no estúdio! Certamente iria enriquecer ainda mais as opiniões do sim!
Gostaria era de vincar a face ludibriosa e enganadora do não de se virar para falsas questões, manipular as audiências e oferecer falsas informações. Não me digam que não se resolve nada com a nova lei porque "depois das 10 semanas é tudo igual" é um argumento minimamente válido e honesto. Talvez haja quem legisle, vote favoravelmente a perguntas para referendos, e tenha sido ministro que ache que não há diferença no antes e depois das 10 semanas, como 80% das interrupções.... Tenho pena que as perguntas de Vasco Rato (!!) não tenham sido respondidas. E claro, a nossa 'colega' Cátia Guerreiro que veio 'desinformar' e falar no tema das maternidades a despropósito e com total desconhecimento de causa...
Ah, e claro, o querido Eurostat, que só serve para algumas coisas (porquê que só se ouve o exemplo de espanha, onde 50% dos abortamentos são feitos a estrangeiras, e só há abortamentos em clínicas privadas?, e nunca se ouvem os exemplos da suíça, etc? ou até do canadá? e porque é que interessam os números e nunca interessam as causas - o famoso 'porquê'?)
De resto, gostei, foi bastante claro e arrebatador. Só espero é que a nossa população tenha espírito crítico suficiente para contestar alguns dados, e não se desviar da questão essencial que, como ressalvou muito bem, foi unânimemente aceite por todos em estúdio (e arrisco-me a dizer em todo o país - acho que toda a gente conhece alguém que abortou, não conheço ninguém que sequer se disponha a acusar alguém) logo no início do programa, com um silencioso e sem hipocrisias Sim!
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