segunda-feira, fevereiro 28, 2005

Fuga

Por vezes, quando o cansaço faz valer os seus direitos, "repouso" numa actividade automática - jogo gamão na Net. A identificação é impossível, para lá da nacionalidade do oponente. E no entanto um padrão emerge: quando pressentem a iminência de uma derrota, muitos adversários desaparecem. Sem uma palavra de adeus. A minha deformação profissional alerta para os sinais de intolerância à frustração - "Vou perder? Nem pensar! Piro-me e regresso à estaca zero". Encontro este modo de funcionamento todos os dias nos toxicodependentes. Que boa gente prefere considerar "extraterrestres", se comparados aos "normais e respeitáveis". Não penso assim. Os toxicodependentes são exemplos acabados de uma lógica consumista levada ao extremo, surda à chaveta legal/ilegal. Mas não só. A avidez pelas drogas traduz também a tal intolerância à frustração, ao menor sinal de angústia ou depressão o indivíduo "medica-se" através da anestesia dos afectos. Que não passa de uma fuga quieta...

domingo, fevereiro 27, 2005

O contágio

Durante a minha adolescência, se alguém na televisão debitava um discurso ridículo, meu Pai sussurrava, condoído: "Não se importam de desligar? É penoso ver ao que as pessoas chegam". Nessa altura eu lidava mal com uma agressividade pressentida como perigosa e não me agradava reduzir ao silêncio a caixinha mágica e com ela um alvo fácil da ironia que drena a vesícula mais azeda:). Dei comigo a reviver tais momentos ao escutar Santana Lopes, disparando sobre quem no Partido, por falta de solidariedade para com o "menino guerreiro", teria sido responsável pela derrota. E com a ajuda não solicitada dos anos que já carrego entendi o meu Velho - o ridículo não se limita a matar quem habita; chegado a certo ponto diria que se torna contagioso... Com a extraordinária agravante de sermos nós a sentir vergonha!

quinta-feira, fevereiro 24, 2005

A dúvida

Que nos proporcionará a formação do novo Governo? Refrescante safari em busca de Novas Fronteiras ou melancólico passeio pelas quintas do PS? A ausência de euforia popular na noite de eleições disse tudo: a satisfação pela partida de quem até os seus opositores embaraçava foi mitigada pela dúvida sobre como será preenchido o vazio que antes de ser já o era. Por quem? Com que resultados práticos? Se o país não estivesse teso, empregaria o calão do póquer da minha juventude dizendo que o povo paga para ver. Assim, receio que a comparação mais adequada seja outra: os eleitores meteram os relógios no prego e entregaram o dinheiro daí resultante ao PS, a quem fitam com o credo na boca. Porque se ele aposta mal e perde, o próximo jogo será a feijões. Quando muito e se chover!

quarta-feira, fevereiro 23, 2005

Mozart

Mozart. E o fascínio por esta música, que faz um ouvido duro como uma porta adivinhar a nota seguinte. O segundo marido de minha Avó tinha razão - perdida o sonho do esperanto como Língua universal..., resta a música!

Exames

Corrijo pontos de exame. Nhac:(, montes deles! Durante a prova um aluno queixou-se de não estar habituado a perguntas de desenvolvimento, cercado como vive por exames de escolha múltipla. Não creio que a razão seja apenas essa, a "garotada" não adquiriu o hábito de elaborar o pensamento de uma forma própria, única, "original". O resultado é este: uma sucessão deprimente de respostas quase milimetricamente iguais umas às outras, produtos óbvios de marranço virgem de elaboração posterior. E assim se adquire - quando muito... - conhecimentos e se perde a oportunidade de ensaiar o bailado de neurónios que um dia, com muita vida em cima!, conduziria ao "grand final" da sageza nas cabecinhas das elites da Nação. Oremos...

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

Eastwood

Million dollars baby é deslumbrante! Ainda mais "ascético" do que Mystic River, um exercício de recusa absoluta do acessório, tornado desnecessário por três interpretações fabulosas e um argumento brilhante. Brilhante e não fracturante!, como se gosta de dizer cá no burgo... Fracturante porquê, de facto? Por existirem opiniões divergentes? Também eu recuaria perante a morte assistida, se considerasse a vida uma entidade generosamente propiciada a cada um de nós por Deus. Não considero. A Vida não existe, mas sim as nossas vidas. E a morte faz parte delas. Podendo inclusivamente "estragá-las", se lhes retirar a dignidade que constitui a coluna vertebral da existência. E nesse caso aceito sem rebuço que alguém, de uma forma lúcida, decida partir. Para preservar o que viveu, não se resignando a simplesmente sobreviver, de forma vegetativa.
Mas voltemos a Eastwood. Um famoso cirurgião gabou-se uma vez de nunca ter encontrado a alma na ponta do seu bisturi. Pois o velho Clint, a partir de Imperdoável, não a deixa escapar à câmara. E sem filtros de qualquer espécie...

domingo, fevereiro 20, 2005

Confirmação

Só vim ver se a tecnologia tinha funcionado...

Alívio

Não creio que se deva complicar o que hoje se passou neste país, o resultado destas eleições traduz apenas um esforço conjunto dos eleitores para preservarem a saúde mental. E a poesia vem sempre a propósito:

Sweet Jane

vivi muito tempo pendurada de um fio
telefónico de uma caixa de correio sem fechadura das mãos
de uns homens que não quiseram encontrar-me

acumulava toda a espécie de comprimidos esquivava
como podia os domingos à tarde vivi
demasiado tempo do outro lado do ecrã

a olhar o amor pelos anúncios.

(Pablo García Casado).

Hoje passámos para o outro lado do ecrã. Espero que o PS tenha aprendido a lição... Fiquem bem.