quarta-feira, outubro 26, 2005

Satisfaria hoje Hipócrates o seu juramento:)?

"Hipócrates" cita o belo juramento atribuído..., ao outro Hipócrates:). E um tipo interroga-se, que pensaria hoje dele? Os avanços tecnológicos da Medicina puseram questões insuspeitadas, não por acaso a Bioética é uma área em permanente ebulição. Quanto aos inegáveis e tradicionais privilégios da Instituição Médica - com as óbvias variações nas práticas individuais que cada um de nós conhecerá - eles radicam, por exemplo, no emergir da Medicina como sistema moral em sociedades cada vez mais laicas. A "imposição" de estilos de vida saudáveis é um sinal do estatuto atribuído a quem trata, cura, retarda a morte. E no entanto, os inquéritos mostram que, à mistura com esse temor quase reverencial, cresce um descontentamento que já nada tem de surdo e se baseia numa relação médico-doente assimétrica, em que o segundo é tratado como portador de sintomas e o primeiro assume a condição de único Sujeito. Tristemente, o exponencial aumento do poder terapêutico foi acompanhado pelo desleixo relacional, substituído por uma fé optimista e preguiçosa nos meios auxiliares de diagnóstico.

21 comentários:

Manolo Heredia disse...

Será ético forçar o cruzamento de animais para obter este ou aquele aspecto? (cães de caça ou de regaço).

Será ético manipular o embrião in-vitro de uma mulher para evitar que a futura criança não seja asmática.

Será ético manipular o embrião in-vitro de uma mulher para que a futura criança venha e ter olhos azuis?

Será ético retirar células de um embrião humano que sobejou de um processo de reprodução assistida para reproduzir a pele da cara uma senhora que ficou desfigurada num acidente? E de uma senhora normal?

A ética tem tudo a ver com a assimetria do acesso à técnica. É ética toda a operação biológica que põe em pé de igualdade os aplicadores dessa técnica.

É por isso que os cereais geneticamente transformados já não estão a ter tanta contestação, porque há cada vez mais países a dominar essa técnica.

Pamina disse...

Eu gostaria de destacar o último período do post. Penso que a maioria de nós já experimentámos este "desleixe relacional" e fomos vítimas da "fé optimista e preguiçosa nos meios auxiliares de diagnóstico", saindo do consultório com uma batelada de análises, ecografias, TACs, etc. para fazer, mas não esclarecidos e absolutamente aterrorizados.
Gostei da palavra "preguiçosa". Acho que é mesmo isso. É um bocado como fazer contas sabendo a tabuada ou só com a máquina de calcular.

Unknown disse...

Dr. Murcon
Estive a fazer um teste para musica lá no meu canto. Dê lá um pulinho e se lhe agradar o esquema diga qualquer coisa.
Tentarei, dentro do possivel, conseguir algumas das musicas que o Porty tinha aqui.
Envio-lhe os links com tudo bem arrumadinho e certamente o Viktor melhor que eu lhe dirá o sitio certo para os colar.
No que eu puder e alarvidades à parte... Use e abuse ;-)

Anónimo disse...

Tristemente, o exponencial aumento do poder terapêutico foi acompanhado pelo desleixo relacional, substituído por uma fé optimista e preguiçosa nos meios auxiliares de diagnóstico."

O exemplo comparativo que vou dar não será o mais feliz nem o mais co-relacionável, matematicamente falando, mas não deixa de permitir uma certa comparação.

Já lá vai o tempo em que um mecânico de automóveis era capaz de identificar uma avaria num motor através do seu ouvido treinado por anos e anos a ouvir o roncar de motores. Hoje em dia, qualquer mecânico utiliza dispositivos automáticos de diagnóstico. Não vejo mal nenhum nisso, bem antes pelo contrário. É mais eficiente e mais eficaz.

No entanto, se tiver que me deslocar a uma oficina, por mais sofisticados que sejam os seus meios de teste e reparação, também gosto de ser bem atendido. Uma coisa não invalida a outra.

Sempre que levo o carro à oficina, o concessionário envia-me por correio um inquérito para avaliar a minha satisfação quanto ao serviço prestado. Satisfação em todas as vertentes, não só na vertente estritamente técnica.

Mas no universo da Medicina em Portugal, a estória é outra bem diferente. O que faz falta a muitos dos médicos que se julgam com o rei na barriga é terem que ser avaliados pelos clientes, ou seja, pelos seus pacientes. E em todas as vertentes do serviço, onde se inclui, obviamente, o aspecto relacional.

Com o tipo da oficina, eu até sou capaz de lhe dizer - na cara - que o gajo é um trombudo do caraças. Com um médico qualquer, tenho algum receio porque o sacana poderá ter - no limite - a minha vida nas suas mãos. E quando se trata de um filho, pior... ainda mais cautelosos acabamos por ser se tivermos que ter um desabafo.

É esta espécie de chantagem psícológica que permite que continuem a existir médicos que, podem até ser muito bons técnicos, mas são - muitas vezes - do ponto de vista relacional, uns autênticos carroceiros. Isto sem ofensa para os carroceiros... ;-))

Anónimo disse...

e para além do mais, por vezes parece que quase se esquece aquele elemento primordial que está na origem de qualquer recurso a um terapeuta: a dor. Falo daquela dor tão grande que se torna impossivel sequer adjectivá-la. A dor que doi pelo verso e pelo reverso. Falo do que conheço. Falo de passar 15 anos a dizer tão simplesmente:tenho dores, e ser descartada de especialidade em especialidade médica sem que, olhos nos olhos nos digam talvez eu não saiba o bastante mas vou tentar diminuir a sua dor. Não pede mais o doente do que a cumplicidade de quem tem, porque o jurou, o dever de o tratar. Bom seria que a classe médica se debruçasse sobre o quanto existe ainda de encenação na relação médico/doente, com o grande feiticeiro de bata branca desempenhando no segredo dos deuses o seu mister.

K. disse...

Tem razão. Hoje muitos parecem fazer apenas um juramento de Hipócritas. ;)

Anónimo disse...

(poesia obrigada a mote)

A UM CAVALEIRO DA TÁVOLA MURCÒNICA


À caça foy mi marydo.
Me leixou neste abandono.
Ele pensa que é meu dono,
De meus "joules" garantido.

Mas vós, brilhante mancebo,
Me fizestes ir à essência
De meu fogo femynil,
Sem precisar de placebo
Para mitigar a ausência.

E se rebuçado vi
Na vossa verga assestada,
Foi o prémio que escolhi
De me terdes enlevada
Noutros gozos que pedi.

Não lamentem meu marydo
Mais a bolsa de perdizes,
Porque algumas meretrizes
E comezainas e bêbedas,
Lhe estarão já no sentido.

Celebre ele a virilidade
E a ilusória tutela,
Que eu celebro esta vontade
Vontade que me atravessa
De mandar pela janela
O cinto de castidade
Que ainda tenho na cabeça.

Da Truz-truz para o Cavaleiro Ruydo en su Tino.

Moon disse...

Boa noite a todos.

A figura do "médico de aldeia" tão bem retratada nos livros de Fernando Namora, infelizmente, já era...
Embora, eu tenha a sorte de conhecer alguns (few) peregrinos...
E, claro, nestas matérias (como em outras tantas) o poder económico dita as regras.
Quem pode escolhe o médico mais adequado ao seu caso ou com quem tem mais empatia.
Quem está sujeito ao sistema nacional de saúde está entregue, na maioria das vezes, ao seu destino...
Como em todas as profissões, existem bons e maus profissionais, mais ou menos conscientes. E é graças ao esforço de alguns que (muitas vezes) o sistema não se deteriora.
Mas mesmo com muito boa vontade o que dita, por vezes, a qualidade do trabalho prestado são as condições em que o mesmo é prestado.
E tanto quanto sei, na maioria dos Centro de Saúde e Hospitais do nosso país os utentes são tratados, frequentemente, como números.
Felizmente vai havendo uma maior consciência e mesmo no sector privado as coisas estão a mudar (lentamente). Conheço muitos médicos que atrasam em horas a chegada ao consultório (sem razão aparente) e conheço alguns para os quais é "ponto de honra" respeitar a agenda e que se dão "ao trabalho" de pedir desculpa quando se atrasam.
Acho que esse é o caminho.
O respeito é fundamental.
Como costumo dizer: que adianta ir à lua se cá em baixo as coisas continuam desta forma?!

Moon disse...

Caro professor:

Este seu cantinho é uma delícia!

Ainda não estou bem por dentro mas já deu para perceber que isto é uma boa "amostra" da nossa sociedade: há de tudo!
Inteligentes, divertidos, tempestivos, inoportunos, impertinentes, coerentes, incoerentes, audazes, tímidos, cultos,humildes, intlectuais, graciosos, etc...
Ah, já me esquecia, e há o "Noise"!
Só ele é uma força da natureza...(Dá cá uma "trabalheira" ler aquilo tudo...É claro que para além de algumas gargalhadas muitas vezes faz-se luz)
Seja como for, professor, tiro-lhe o "chapéu"! É UM VERDADEIRO FILANTROPO!
O seu Blog poderia ser considerado como uma daquelas alternativas que (palavras suas) "levam a palma" à medicina ocidental na escuta destes "probres humanos" (palavras minhas).

BEM HAJA, PROFESSOR!

Infielmente sua
"Moon"

amok_she disse...

...bem me queria parecer q haveria, por aí, outra dama com mais direitos sobre a trova -by Cavaleiro Ruydo en su Tino- que eu...:-> :->

Anónimo disse...

Pode parecer mentira, mas hoje só tenho boas coisas para dizer.
Fui sempre bem tratado, e pelo SNS, fosse em situações mais vulgares ou normais pelo médico de família ou SAP, fosse em três situações um pouco mais específicas no hospital.
E o bem tratado engloba a parte médica e relacional, realmente com tudo o que ouço até parece estranho.
JF

andorinha disse...

Como já aqui foi dito, na classe médica há bons e maus profissionais, como em qualquer sector.
O que eu ressalto do post é mais uma vez a referência à qualidade assimétrica da relação médico-doente. Para mim este é um dos aspectos mais negativos da medicina tal como ela é muitas vezes exercida.
Quando o médico assume a condição de único Sujeito, as coisas vão mal e muitos ainda funcionam neste registo, infelizmente.
Aliar bons conhecimentos científicos a uma boa capacidade relacional eis o que faz o bom médico.
Também ter só boa capacidade relacional e não ter conhecimentos sólidos do que pratica também não nos leva a lado nenhum.:))........

Diz o Fora de lei(7.01) que "o que faz falta a muitos médicos...é terem que ser avaliados pelos seus pacientes."
Aí a culpa também é nossa, continuamos a ser um país de brandos costumes. Por que não devemos nós avaliá-los? Avaliá-los e rejeitá-los, se for caso disso?
Por outro lado, como diz a moon((9.24) compreendo que nem sempre isso seja viável.

Anónimo disse...

Prof. JMV,

“em que o segundo é tratado como portador de sintomas e o primeiro assume a condição de único Sujeito. Tristemente, o exponencial aumento do poder terapêutico foi acompanhado pelo desleixo relacional, substituído por uma fé optimista e preguiçosa nos meios auxiliares de diagnóstico.”

A Medicina deveria ser antes de mais, preventiva e só depois curativa. O paciente que tende a procurar ajuda quando já se sente mal, está numa posição deficitária para se relacionar com o médico, discernir e avaliar. Se tiver a sorte de encontrar um bom profissional (o homem por detrás da bata), as coisas correm bem, caso contrário, fica refém.

Pessoalmente não tenho razão de queixa, em nenhuma situação, mas sei de quem tenha, o que considero inaceitável.

Saudações,
Débora

Anónimo disse...

Por isso é que esta classe profissional é hoje aquilo que é... Um nojo!

Vejam mais esta escandaleira do actual governo... E, já agora, confiem na objectividade da análise jornalística. Vá lá... confiem neles!

É mais um escândalo... agora com os JORNALISTAS. Porque é preciso ter os jornalistas na mão, o sub-sistema de saúde destes pardais é INTOCÁVEL!!!

A caixa de previdência e o abono de família dos jornalistas é dirigida por uma comissão administrativa cuja presidente é a mãe do Ministro António Costa e do Director-Adjunto da Informação da SIC, Ricardo Costa (Maria Antónia Palla Assis Santos - como não tem o "Costa", passa despercebida).

O inefável Ministro José António Vieira da Silva declarou, em Maio último, que esta caixa manteria o mesmo estatuto. Isso inclui regalias e compensações muito superiores às vigentes na função pública (ADSE), SNS e os outros sub-sistemas de saúde.

Mas este escândalo não será divulgado pela comunicação social, porque a “oferecida” classe dos jornalistas é parte interessadíssima!!!. Assim, há então que o divulgar por esta via (e outras).

noiseformind disse...

Eu acho que é um problema típico da escassez.
A minha mãe desde que passou para um seguro de saúde privado tem sido atendida por um conjunto de médicos de LEste que são super-atenciosos, consultas extensas, tem tratado de coisas que julgava crónicas e que afinal simplesmente os médicos nunca se tinham interessado em tratar. E o custo não é assim tão exponencial.
Claro que o seguro de saúde é galego, algo que eu acho que muitos dos nossos compadres de blog poderiam pôr como hipótese. Os seguros de saúde em Espanha custam em média metade dos de Portugal em as mesmas coberturas.
Tb há a hipótese de EMIGRARMOS TODOS!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

QUEM É QUE QUER VIR????????????????????????

noiseformind disse...

anónimo,
Já lhe chamaram ignorante? ; )
E a sua mamã não lhe ensinou que mentir é feio? ; )

Anónimo disse...

Plim, plão, o meu pai é empresário, a minha mãe tem consultas extensas, o custo não é assim tão exponencial, plão plim, os seguros galegos são uma hipótese, eu tenho um advogado que é uma fera e eu sou o melhor, plim plão, este é o meu fado singelo, plão plim, plão

Rui Diniz Monteiro disse...

Criticamos os médicos por pouco falarem connosco, mas perguntemo-nos porquê.
Será que eles estão a começar a não conseguir ver em cada doente um ser humano? Porque aparecemos cada vez mais como clientes, prontos a reclamar se alguma coisa não correr como esperávamos?
O que eu quero dizer é o seguinte: a compreensão e a proximidade não deverão partir de ambos os lados, de médicos e de doentes, e não apenas dos médicos?
O que fazemos nós, doentes, para propiciar uma saudável relação doente-médico? Se calhar há aqui algo que também temos de aprender, não será?

SDF disse...

Creio que a "medicina como sistema moral" (acabei de ter um acto falhado curioso agora: Na frase anterior à primeira tentativa escrevi "medicina como sistema amoral"...) - mas adiante! Dizia eu que creio que tanto a referida "medicina como sistema moral" como a "relação médico-doente assimétrica" se prendem basicamente com o problema do paternalismo/divinização da medicina, que me parece um efeito secundário da evolução científica e tecnológica, efeito esse que acredito não ter sido desejado nem por médicos nem por pacientes, mas que é uma realidade e que para bem de todos tem de ser combatida.

Se recuarmos no tempo, encontramos uma realidade diferente; Os médicos eram respeitados, mas não eram divinizados. Eram vistos como alguém que ajudava a curar, não como alguém que salvava. Os milagres pertenciam ao foro da religião, e em caso de doença, o médico era o amigo que dava a mão, que aliviava a dor física, mas era ao padre e a Deus (não interessa qual) que se pedia o milagre da cura. Com a evolução tecnológica e do conhecimento científico ao nível do funcionamento do organismo humano, os médicos passaram a curar e a salvar para além de aliviar. E deu-se o processo de transferência dos supostos poderes divinos de Deus para o médico. Existe hoje o mito de que a ciência médica está muito mais avançada do que na realidade está, de que os meios auxiliares de diagnostico são capazes de diagnosticar tudo sem margem de erro e que as intervenções médicas, hoje apoiadas por ferramentas equipamentos sofisticados são 100% eficazes e eficientes. Tudo mito, tudo ilusão. Não queremos encarar de frente a realidade de que a medicina é uma ciência que evolui por tentativa erro; que o treino dos médicos é obrigatoriamente feito sobre pacientes vivos a bem da evolução da medicina do futuro; que as ferramentas e os equipamentos, sofisticados ou não, e por mais monitorizados que sejam, são passíveis de descalibrar, de avariar e estão permanentemente limitadas na sua capacidade ao conhecimento médico vigente; que os médicos são seres humanos, que o erro é humano; que os seres humanos erram mais quando trabalham sob stress e que a profissão médica é precisamente caracterizada pela pressão constante. A pressão da duvida e da tentativa erro, a pressão de uma vida nas mãos, a pressão do tempo; a pressão do excesso de pacientes e da falta de meios e de infra-estruturas, etc.etc.etc.

Apesar da simplicidade de compreensão racional desta realidade - e a maioria de nós SABE que é assim, continuamos a resistir a SENTIR, a ACREDITAR realmente que é assim. Quando a doença nos toca de perto, a razão eclipsa-se como que por magia, e à falta de alvo mais credível para a nossa fé, depositamo-la inteirinha na ciência médica, e esperamos que ela, através dos seus instrumentos técnicos e humanos, opere o milagre que necessitamos. E quando o milagre não acontece... está logo o caldo entornado!

Esta ilusão é geradora de conflitos e descompensações para todos os envolvidos: Os médicos carregam um fardo sobre os ombros que não podem suportar; os pacientes e as suas famílias sentem-se continuamente defraudados nas suas (irrealistas) expectativas. E se antigamente se sacrificavam vidas no altar e se queimavam bruxas na fogueira, quando era preciso acalmar a ira dos deuses ou arranjar um bode expiatório quando as coisas corriam mal, agora crucificam-se médicos na praça pública com processos legais e mexeriquice sensacionalista nos media. Ou seja, os meios e os alvos mudaram, porque se evoluiu tecnicamente e se transferiram os poderes divinos para alvos diferentes, mas o nosso "modus-operandi" interno, esse continua muito semelhante.

E como é que se sai daqui? Pois... esse é o verdadeiro desafio que temos de enfrentar. Já estão, um pouco por todo o mundo a ser dados alguns passos. Mas também estes passos são incertos e por tentativa erro, pois estamos todos a aprender com os nossos erros.

O consentimento informado foi, em termos conceptuais, um bom passo. Mas muito ainda falta fazer para que ele se torne uma realidade na prática pois todos sabemos que neste momento o que existe anda mais perto do consentimento desinformado e/ou manipulado do que realmente (bem) informado. Porque não há tempo; porque nem sempre o paciente tem capacidade para absorver a informação nem o medico competência pedagógica para a transmitir de forma perceptível a um leigo em medicina; porque nem todos os pacientes querem sequer ser informados ou aceitar a responsabilidade sobre a decisão do seu tratamento e por mais uma serie de razoes. E como muito bem refere Esperança Pina no seu livro “A responsabilidade dos médicos”, o consentimento-informado trará sempre conflitos entre os princípios de autonomia e de beneficência.

Há muito, mas mesmo muito a fazer em ética clínica, essa área do vasto território da bioética, que se ocupa destas questões. Há que mudar processos documentais e operacionais nas instituições de saúde; há que harmonizar códigos, regulamentos e legislação cujos conteúdos são conflituosos entre si; há que desenvolver e actualizar ferramentas de apoio à decisão ética (como a Bochum check-list por exemplo) e forma a torná-las mais práticas; e o mais difícil, há que mudar mentalidades, Desresponsabilizando os médicos e responsabilizando os pacientes, no que toca a algumas decisões, mas de forma realmente informada e não apenas burocrática, como acontece nos dias de hoje, em que isto é feito através da assinatura de um documento de autorização da prática de um acto médico que na maioria dos casos o paciente nem sequer compreende.

E é absolutamente necessário criar nas instituições de saúde equipas multidisciplinares capazes de fazer isto acontecer de forma serena – Muitas situações são apenas possíveis de ser analisadas na íntegra em transdisciplinaridade, pois contêm variáveis nas áreas da sociologia, da psicologia, da religião, do direito, da ética. Os médicos não podem – nem devem tentar - abarcar todos estes conhecimento, pois isso distraí-los-ia da sua verdadeira área técnica, a qual já é por demais complexa e já evolui a um ritmo alucinante, quase impossível de acompanhar. É preciso, por isso, retirar-lhes alguns papeis sociais de cima dos ombros que eles não têm qualquer hipótese de cumprir e deixar de os criticar por isso. Temos tendência a lembrar-nos do papel multidisciplinar que os médicos de antigamente desempenhavam, mas a esquecermo-nos de que nessas outras épocas, eles dispunham de tempo e de disponibilidade emocional para tal, dada a simplicidade das intervenções técnicas que estavam ao seu alcance.

À semelhança do que é já hoje uma realidade em muitos países, também aqui e no resto do mundo, os gabinetes de ética clínica, onde trabalham estas equipas multidisciplinares, terão de se tornar uma realidade quotidiana e passarão a desempenhar um papel fundamental na gestão de prevenção de muitos conflitos entre médicos e pacientes.

Deduzo que quem tiver tido paciência de ler este comentário até ao fim seja tão interessado por esta área como eu, e nesse caso atrevo-me a estender o convite para ler uma comunicação minha relacionada com este tema, a qual poderá ser encontrada em http://cobrecanela.blogspot.com/2003_08_31_cobrecanela_archive.html


(mais um comentário que ficou tão longo que vai emigrar para post lá para as minhas bandas!)

Anónimo disse...

Olá Rui .. estou a ver q ainda não o trataram como uma estatística .. e ainda bem! ... mas outras realidades apontam mais para outros direcções .. ora aqui está uma matéria em q eu gostava mesmo de estar errada :/

Lótus

Roberto Iza Valdés disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.