segunda-feira, junho 23, 2014

A quadra.

Maria,
Beira-rio a conselho médico, trote arquejante, bancos olhados de esguelha - para não ceder à tentação, livro exilado em casa... -, navego entre doces, carrinhos de choque, matrecos e gentes que olham o céu com alívio, S. Pedro não prepara desfeita ao amigo João,  assim protegendo o negócio, “sardinha e broa, euro e meio”. Estivesses aqui e velha discussão nasceria da tua juventude, o meu horror a noitadas e multidões a empurrar-te para os festejos, “levas a chave, acordas-me à chegada e abusas de mim...”. O sobrolho franzido – “das três sugestões aceito duas. Quanto ao resto, prefiro adormecer contigo. Jantamos com a malta e vimos cedo, já te disse que o prazer das noitadas não depende do bilhete de identidade”. Ano após ano, o mesmo ritual: protesto meu, decisão tua, amor nosso.
Mas tu não estás. E assim ficou prejudicada a barraca dos doces, alguns com nomes açucarados que provocariam o teu azedume, falso como Judas, “pois não sabes que ando a tentar...?”. A tentar sim, querida, a conseguir talvez em Londres, que no Porto, viver-te era como trautear o Chico, jamais faltava açúcar e afecto J. Dei comigo a fazer alongamentos batoteiros ao pé dos manjericos, sem grande esperança passei os olhos pelas quadras, lembrei com um sorriso as do meu tempo, muitas não resistiam ao “repenica, repenica...”, o Santo fazia o resto como qualquer normal pecador e nós ríamos, imberbes. Menos fisiológicas as actuais, mas não demasiado inspiradas. Até que...
Chamei a senhora, perguntei o preço. O meu ouvido, cuja dureza já não se satisfaz com a música, a trair – “dois euros e meio?”. Eram doze... Queixei-me sem muita convicção, ela percebeu-o de imediato e iniciou um discurso pausado e didáctico sobre jarros de água, prato por baixo do vaso e longevidade, “dura-lhe até ao Natal!”. Que importa? Que importa se me trouxe a tua imagem a rodopiar, agarotada – “gostas?” -, eu transformado em público tão entusiasta como agradecido, a humidade portuense como álibi para voz rouca, “sim”.
Sim, querida, como resistir à quadra?:
“Quando as saias arregaça,
  Para bailar livremente,
  Maria, cheia de graça,
  Faz a desgraça da gente...”.
Marotos versos tripeiros, irmãos de fantasias minhas.

(Só não gostei muito do plural que “gente” abriga...).

12 comentários:

andorinha disse...


Lindo! Como sempre que fala com a Maria:)


(Só não gostei muito da ciumeira final...)




:)

Anónimo disse...

Entre o céu e o inferno
São João
E São Pedro
Santo António é para toda a gente

Bartolomeu disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Bartolomeu disse...

Quando a saia arregaça,
Desde que para bailar.
Não há gente, há só graça,
E o seu doce rodopiar.

Deixe que a Maria baile,
No seu sonho ribeirinho.
Que os seus braços sejam xaile
Que a aconchegam no caminho
Depois de deixarem o baile,
Enquanto regressam ao ninho.

Rosário disse...



Esta sua Maria é "imensa"...que inveja!

Anónimo disse...

Quem Sai Aos Seus Não Degenera

murcon disse...

Bart,

Uma delícia:))))).

andorinha disse...

Também gostei, Bart :)



https://www.youtube.com/watch?v=xfwMX0-dUNM


Boa terça.



Bartolomeu disse...

O que é que não faço para vos saber felizes, meus murcõezinhos adorados?!
;))))
E Viva o Sõe Joõe!!!!!

Anónimo disse...

Bartolomeu. Obrigada pela parte que me pertence! Que seja retribuida? Na mesma proporção...

andorinha disse...



Não fazes mais que a tua obrigação, Bart:))))))))))))))))

Aliás, devias fazer mais vezes....lol


Fica bem:)

Anónimo disse...

Princesa Rosário, Inveja Tenho Eu De Não Pertencer À Velha Revolução. Meu Pai Nasceu Antes Do Dia Da Instauração Da Republica E Minha Mão Já Na Instauração Da Democracia! Só Falta O Natal Ser Dia De Todos Os Santos? O Momento Em Que Se Nasce Ser Feriado Religioso...